A HISTÓRIA DE ELZA

Num dia ensolarado de maio nasceu Elza, criança afável, adolescente sem problemas e uma adulta solitária. Pensando bem a vida de Elza daria um romance. Uma história sem príncipes encantados, sem maridos e filhos. A mulher que hoje vive num Abrigo de Velhos, abandonada pela família um dia foi uma moça dedicada e trabalhadeira. Ela tem amor próprio, mas sempre colocara as outras pessoas em primeiro plano, servir a todos para depois suprir suas próprias necessidades, seus anseios e sonhos. Estudara mas nunca tivera oportunidade de mostrar suas habilidades num trabalho que pudesse lhe render seu sustento, e por quê? Pura falta de tempo para si mesma. Quando terminou o ensino médio e o curso de Inglês a mãe estava muito doente, o dever de filha mais velha a obrigara a ficar em casa cuidando da mãe e dos irmãos. A enfermidade materna perdurou por vinte longos anos. Os irmãos mais novos estudaram, conseguiram bons empregos, se casaram e Elza teve um grande mérito nessas conquistas, abandonava tudo e corria acudir um e outro. O tempo passou, a mãezinha doente morreu e a vida de Elza também passava. Os anos se diluíam como fumaça e ela andava de um lado para o outro socorrendo a família, primeiro os de sangue, depois os sobrinhos e consequentemente os filhos dos sobrinhos. Está com setenta anos de idade, mas em pleno vigor físico, a mente lúcida consegue processar tudo a sua volta. Tia Elza faz o que sabe fazer, é uma ótima babá, cozinheira e arrumadeira. Às vezes se aventura em tarefas arriscadas. Esse foi seu erro fatal. O menininho, filho da sobrinha neta queria um biscoito, cuja lata estava no alto de um armário. Sem malicia a velha senhora usa uma cadeira quebrada para ganhar altura e despenca lá de cima. Gritos de dor seguidos de meses de internação e a confirmação do médico de que jamais voltará a andar, a queda provocou a fratura do fêmur e devido à sua idade avançada não suportou os pinos. Embora se mostre conformada com os desígnios de Deus, Elza estava muito abalada com o fato de ser obrigada a substituir suas pernas por uma cadeira de rodas. Chega o dia da alta hospitalar, aparece uma das sobrinhas visivelmente contrariada para busca- la. A tia convalescente a recebe com um sorriso, pois sempre auxiliara a todos os parentes todas as vezes que foi requisitada e sem pedir nada em troca. Com tristeza ouve os resmungos da mulher: - Como pessoa idosa e imprestável dá trabalho! Desde o acidente que a pobre Elza vive numa verdadeira Via Crucis, indo de Herodes a Pilatos, sem encontrar acolhida no lar dos familiares. Sem filhos, sem amor, hoje ela olha o mundo lá fora pela pequena janela do asilo. É dia de visitas, ela espera ganhar presentes de algum dos visitantes, talvez um sabonete, quem sabe um creme hidrante, ou um corte de cabelos. Ela sempre fora uma mulher vaidosa, cuidava dos cabelos e usava perfume com uma leve fragrância de flores. Nesse dia em especial, a solitária velhinha, talvez pela expectativa de receber visitas, sente uma doce melancolia invadir sua alma, uma estranha paz inunda seu espírito. Olhando pela janelinha, ela vê o jardim e um beija flor pousando numa rosa vermelha, seus olhos ficam pesados e um cochilo agradável amortece seu corpo debilitado. Nessa hora ela ouve vozes que falam baixinho, talvez para não tira- la daquele leve torpor. Relutando contra o pesado sono, ela vislumbra à sua frente a sua mãezinha a quem ela dedicara boa parte de sua vida, feliz sorrindo para ela, fazendo gestos com a mão convidando a se levantar e ir até ela. A mãe não está sozinha ali. Elza vê algumas crianças e reconhece que são os seus irmãos que criou como seus filhos, e vê os filhos dos irmãos e todos a quem ela tão generosa e desinteressadamente doou- se. Nesse doce delírio ela pensa feliz que:

- A família lembrou- se dela.

Mas a miscelânea de épocas a atordoa. Ela sabe que não está sonhando é muito real o acontecimento que se desenrola à sua frente. Mas de repente as visitas se calam e desaparecem e a mulher decadente vê surgir no lugar delas seres alados que enchem de paz o pequeno quarto apenas um não possui asas, mas seus Olhos são como Labaredas de Fogo. Ao lado Dele está uma Mulher Vestida de Sol. Ele se aproxima de Elza, toca em seu rosto, ela quer balbuciar alguma palavra, mas sua voz não sai, mas como que lendo seus pensamentos o Homem Lhe sorri e responde:

- Vim buscar você, Eu sou o Primeiro Amor.