ABNEGAÇÃO

 
 
Preso entre tantas paredes sem nenhuma perspectiva de saída. Olho para um lado e para outro e nada vejo apenas o vazio da imensidão de uma vida quase toda em vão. Sei que errei, sei que pequei, sei que menti e sei que... ah como eu sei. Eu não queria saber tantas coisas, ao mesmo tempo eu não sei algumas que eu queria tanto saber. Passei a minha vida toda tentando me encontrar e também encontrar alguém pra amar.
Tive tantos encontros, desencontros e nunca um reencontro. Perdi pessoas que amei tanto, perdi pessoas circunstanciais, outras também me perderam, outras simplesmente deixei de amar com o tempo, o mesmo tempo que leva os anos rapidamente ou os traz velozmente.
Coisas boas se foram pra sempre e coisas ruins se aproximaram numa velocidade estupenda. Hoje estou aqui tentando tanto, querendo e precisando amar de novo. Contudo me vejo perdido num jogo que mistura traição, paixão, amor, devoção, insatisfação, cobranças, desapontos, acusações e absolvições e tanta, mais tanta solidão; solidão a dois, a sós, a mil. Vivo driblando as minhas emoções e os meus anseios mais íntimos e ínfimos e até mesmo o meu instinto, que está sempre em contramão me levando a exaustão. Vivo me enganando dia após dia... maldito lampejo de esperança que não se esvai nunca, mesmo diante da maior evidência de que não existe mais inocência.
Algo de estranho e incompreensível me faz continuar nessa luta contra mim mesmo e contra essa força sobrenatural, esse fiapo que resiste incólume e  que vem com tudo contra mim. Mas eu sou assim, essa criatura quase inimaginável, esse ser persistente ou a pessoa mais louca do mundo por acreditar demais no amor e que um dia vou ser feliz, muito feliz. Uma preserverança insana me guia rumo ao desconhecido, ao inevitável descaso do acaso de um imprevisível caso rumando a esmo no espaço sem prazo e sem aparente fim.
Outro dia, outra semana, outro mês, outro ano, outra década se passa e a chegada de um “final feliz” fica mais escassa. Às vezes eu tinha, ou melhor, tenho vontade de desaparecer e reaparecer num lugar bem longe onde eu não conhecesse ninguém. Aonde eu andasse por várias horas ou dias sem ser forçado a me lembrar de nada ou de ninguém. Outras eu sonho coisas loucas como ser raptado por um disco voador... pura loucura. Devaneios de quem na verdade não está satisfeito com a vida, consigo mesmo e com tudo ao seu redor.
Esse vazio pungente, inconseqüente, incoerente, indigente, inerente se agarra a mim como o limo ou o lodo a superfície mais próxima. Que vida é essa? Onde nada presta em que vivo a debalde. Ai que saudade de um tempo não muito distante, onde... eu nem me lembro mais, faz tanto tempo.   Se eu pudesse voltar no tempo, eu faria tudo diferente, eu não cometeria tantos erros e ouviria mais a razão, jamais daria ouvidos ao coração. Talvez assim eu não tivesse derramado tantas lágrimas, nem tão encolerizado ficado, nem tão decepcionado, nem seria tão cabisbaixo e apático.
Hoje... onde estou... aqui na frente desse horizonte e na beira desse precipício... sozinho... só eu e minha dor, minha falta de amor, esse vazio frio, esse circulo sem sentido, essa vida oca, solta, revolta, doida, sem nexo. Onde estou disperso num mar de incompreensão, de insatisfação, de exacerbação, de solidão, de espera, de quimera, da luta da bela contra a fera, da persistência contra a insistência, do óbvio contra a surpresa, dos sinais, dos indícios contra o eterno vício e cego objetivo de realização.
No último pulsar da consciência eis a pergunta: eu pulo ou não?


5ª ANTOLOGIA BECO DOS POETAS – POESIAS E CRÔNICAS. São Paulo: Grupo Editorial Beco dos Poetas & Escritores Ltda., 2010
Zaymond Zarondy
Enviado por Zaymond Zarondy em 28/07/2010
Reeditado em 25/02/2019
Código do texto: T2404742
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