Ausência Presente
A cena de tão silenciosa chamou minha atenção, o adulto de olhar distante, reflexivo, mudava de posição apenas para confirmar os minutos que passavam, cheguei a contar num espaço de três minutos, repetiu aquele gesto por oito vezes, não entendia se era alguém atrasado para um compromisso, um relógio com problemas, ou sei lá o que...
Na mesma mesa uma criança, um menino de mais ou menos nove anos, enfrentando uma batalha feroz diante de meio litro de refrigerante, batata frita e um sanduiche, que de longe temia presenciar o deslocamento do maxilar a cada tentativa de abocanhar o que lhe parecia o manjar dos deuses...
Começo a buscar semelhança entre os dois seres que ocupam a mesma mesa e se quer trocam palavras ou olhares; percebo que deveria sim existir alguma ligação, muito embora, entretidos em seus pequenos ou grandes universos paralelos, talvez nem se dessem conta...
Algo naquele adulto era perceptível na face do menino, aquele olhar distante, além de um sinal, um pontinho escuro que podia ser notado pouco acima do olho esquerdo, sim, aquele era o sinal...
Realmente existia uma ligação entre ambos, tentava desviar minha atenção daquela mesa, mas o diálogo silencioso que ali era travado ainda precisava dizer-me algumas coisas, e disse...
Aquela compulsão por saber a hora certa é quebrada, o adulto olha para o relógio pela última vez e de repente sorri, vira-se para o garoto e informa que o tempo deles acabou, já estava na hora de devolve-lo a mãe, lembrando que o juiz pediu que obedecesse o acordo, portanto precisava deixá-lo em casa naquele momento, e certamemte no próximo final de semana poderiam se encontrar novamente...
Levantou apressado, pegou o menino pelo braço, que ainda tentava vencer a porção de batatas e saiu em meio a praça de alimentação do shopping, olhei ao redor e tive a triste constatação, existiam muitos outros pais e mães de fim de semana ocupando silenciosamente outras tantas mesas, aguardando a hora combinada.