A Taturana Bezerra
Tudo aconteceu naquele dia quando a Nina, a Maria, a Toinha e eu estávamos brincando sob uma goiabeira no quintal da casa do Onofre, primo da Nina.
Não contentes de brincar ali no chão, resolvemos explorar a goiabeira.
Cada uma queria subir no galho mais alto e assim íamos nós numa alegre disputa.
Quando eu já estava num galho bem alto senti uma forte dor na perna.
A dor começou a aumentar até se tornar insuportável.
Olhando para a frente eis, numa folha da goiabeira, uma enorme taturana bezerra toda eriçada.
Com certeza havia tocado a perna em seus pelos venenosos e recebi uma descarga de veneno.
Aos meus olhos de criança parecia que ela queria saltar sobre mim.
Comecei a gritar alucinadamente.
No olhar de cada amiguinha brilhou o terror!
E na boca de cada uma um grito de desespero!
A dor que eu sentia e o pavor que me dominava pareciam tê-las contagiado.
Uma gritaria surda se fez ouvir em cima daquela goiabeira.
Os gritos atraíram as mães e a vizinhança inteira.
Sentia que ia me despencar lá de cima quando duas mãos fortes me pegaram, me tiraram daquele galho e me colocaram no chão.
Era o Onofre que viera correndo ao ouvir também toda aquela gritaria.
Eu já não gritava, mas urrava de dor.
As pessoas se comprimiam para me ver de perto, enquanto iam formulando um mundaréu de perguntas.
- Que aconteceu?
- Ela caiu?
- Quebrou a perna?
- Quebrou o braço?
Todo mundo querendo saber o que estava acontecendo.
Toinha, como sempre, foi a primeira a falar:
- Eu vi! Foi uma taturana bezerra grandona que sapecou a perna dela. Tá naquele galho lá ó...
Onofre subiu novamente na goiabeira, e depois de uma cuidadosa procura, encontrou-a.
Arrancou a folha onde ela estava, ainda toda eriçada, mostrou-a para todo mundo, depois pisando sobre ela a esmagou.
Minha mãe, tomando-me nos braços, levou-me para casa acompanhada das vizinhas curiosas e conselheiras.
- Passa barro na perna dela que é bom.
- Passa óleo Singer.
- Passa álcool.
- Dá chá de erva cidreira.
- Dá chá de funcho. E blá... blá... blá... e eu ali, urrando de dor.
Depois de muitas horas de passar barro, óleo Singer, álcool, beber chá de cidreira, chá de funcho e de não sei mais o quê, a dor foi diminuindo... diminuindo... até desaparecer.
Nunca mais me esqueci daquele dia, nem daquela taturana bezerra.
Não consigo entender porque algo que aconteceu há tanto tempo continua despertando em mim esse sentimento de terror.
Toda vez que vejo uma goiabeira, aquela imagem aparece nítida em minha mente e me faz arrepiar.
Gosto muito de goiabas, mas quero distância das goiabeiras.
Do Livro: “Denúncias Poéticas, Contos e Crônicas” – Pag. 29