O sábado à noite de um velho jeans
Sábado, 7 da noite. Programa mesmo só as dez. Até lá ainda haveria tempo. Embora estivesse louco para sair de casa. No entanto forcei-me a ficar mais um pouco. Ao menos para não parecer que morava em uma cidade dormitório.
Afinal o espaço me pertencia. Por que tratava as minhas coisas deste jeito? Quando comecei a tirar o pó do piso laminado: primeiro com uma vassoura de pelo, depois com a de piaçava, embora o resultado fosse o mesmo: uma droga de serviço! Hora de catar as latas de refrigerante de cima das prateleiras - o que era aquilo: uma central de reciclagem?
Bem, pelo menos o tempo ali dentro agora passava, sem eu precisar me expulsar da minha própria casa. Quando por fim chegou a hora de sair e pegar o Lapa/Ipiranga. Quando em um ponto mais à frente entra uma velhinha. Revoltada com a espera de mais de meia hora.
Senhorinha ultrajada que sentou-se ao lado do motorista para desfiar um rosário de queixas. Enquanto os passageiros dividiam-se entre irritar-se ou sorrir das suas rabugices. Quando não demorou e todos já estavam acumpliciados com os motivos da senhorinha: ora! naquela idade, e naquela hora, ficar meia hora, de pé, plantada no ponto, e ainda à noite, em pleno frio do mês de junho? O motorista então diminui a velocidade, para seguir em velocidade cruzeiro. Parecia divertir-se:
- Reclame no 0800 da empresa, sugeriu. Mas como se o celular da senhorinha estava com a bateria descarregada? Este um argumento que cativou a todos ali dentro. A senhorinha deixando claro que a tribuna para reclamar era ali dentro mesmo.
São Paulo que desta maneira parecia ter encontrado a graça de ser a capital nacional do estresse, quando dali para frente a noite seria da vecchia senhorinha, na sua revanche contra o desconforto que atinge principalmente aos idosos.
Que pena! Chegava a minha hora de descer perto da pluralista rua Augusta, onde os frequentadores mais antigos comemoravam dela voltar ao velho e bom rock and roll, com novas casas noturnas destinadas ao público rockeiro e pubs.
A noite assim pertencia às situações inusitadas, quando levado pelo meu velho jeans pensava que nesta noite ele representava as coisas que não precisavam mais provar o seu valor porque tinham a sua própria história. Mas e aí: ia dar Verdun, ou Fedor Emialenko mais uma vez? Para quem torcer?
Complicado ...
Porque todo mundo era fã do russo, que era a própria humildade. Assim como o brasileiro.
E agora: manteria-se a invencibilidade de uma década de Emialenco? Ou Verdum entraria para a história como o primeiro a vencer aquele que ganha milhões, vence a todos, e continuava levando a vida modesta de sempre, nas regiões gélidas da Rússia?
Do lado de fora do bar a rua estava tranquila e as pessoas pareciam aceitar o destino que lhes cabia viver. No meio disso tudo o meu velho velho jeans, que antes, sempre esquecido no fundo do armário, hoje encontrava o seu bom momento.