Conto de fadas da atualidade
Era uma vez uma pequena menina. Sua mãe não era uma rainha e ela não era princesa de nada. A menininha costumava jogar sementes por onde passava, para que seu príncipe a encontrasse pelo caminho de flores que havia plantado. As flores nunca chegaram a crescer. Em seu lugar, apenas ervas daninhas que a limpeza pública insistia em arrancar.
Uma noite, por causa de um sutiã cor-de-rosa, ela explodiu; gritou e se desesperou. Não usaria uma porcaria rosa. Ouviu a mãe dizer ao telefone que achava que não era bem por causa do sutiã. Não era.
Naquela noite, ela chorou. Recebera poucas horas antes a notícia de que seu pai havia morrido. Não chegara a conhecê-lo.
Decidiu então seguir seus passos para compreendê-lo. Antes disso não poderia, pois não compartilhava de sua dor. Ainda hoje não compartilha. Sua dor é diferente.
Desde esta noite, ela se ocultava na escuridão. Sua dor jamais iria embora.
A menina cresceu e cansou de esperar. Viu que contar a verdade crua nem sempre era a melhor coisa a se fazer e se jogou na vida esperando a morte. Estava certa de que seu destino não a levaria muito longe.
Mentiu, roubou e traiu, tentando chegar ao fundo do poço.
Insistia em fazer desafetos com crueldade. Isso não afastou todas as pessoas. Descobriu que seus amigos verdadeiros insistiriam.
Por causa desses insistentes, não conseguia se afundar com muita rapidez. Definhava lentamente; sua dor apenas aumentava.
Percebeu então, uma mão sempre estendida à sua frente, acima de si, sobre o solo. Sobre a cova que ela mesma cavara para si. Primeiro, desconfiou.
Depois, decidiu arriscar. Segurou a mão. E a mão segurou de volta mais forte, até puxá-la para o topo.
Seu príncipe finalmente havia chegado. Não havia cavalo. Não havia armadura brilhante; usava moletom e camiseta e tinha os cabelos bagunçados.
E ainda hoje tentam se acertar, para, talvez um dia, serem felizes para sempre.
Não foi há muito tempo, nem numa terra distante. Aconteceu bem aqui, na sua frente, só você é que não viu.