PEDRO
A luz do sol invade a sala. Ainda bêbado, Pedro cobre os olhos com a mão. Os dedos encardidos, cheirando a cigarro.
Mais uma manhã.
No quarto, Célia não cerrou os olhos a noite inteira. Que vida, meu Deus!
Pedro se levanta com dificuldade. Vai até o banheiro. Tira a roupa, joga a camisa sobre o vaso, a calça no piso, a cueca. Nu, abre o chuveiro e a água vem como um soco. Sente-se sujo. Sente-se mal. Por que fiz isso?
Célia escuta os sons vindo do banheiro. Vira de lado, pensa em fingir dormir. Os minutos se prolongam. E Pedro, ainda no banheiro.
Dez, quinze, vinte minutos. Aos trinta e tantos, Célia se levanta e vai, passos lentos, até o banheiro.
A porta aberta, como sempre. Pedro parece um menino. E se tivesse alguma visita?
Pedro, sentado no canto da parede, sobre o piso úmido. Olhar perdido, rosto turvo. Percebe a presença de Célia. Ela fica bonita com esse baby-doll...
Célia entra, baixa a tampa do vaso, senta e espera.
O que ela quer? Alguma explicação? Fiz merda! E daí?
Ela, em silêncio, parece gritar. Por que isso, Pedro?
Um minuto, dois, três. O silêncio faz as paredes vibrarem.
Célia o vigia sem olhar.
O que ela quer que eu diga? Que fui para um puteiro? Que comi uma vadia qualquer? Que gastei todo o dinheiro em cachaça?
Ela pensa no passado. Eu não era assim tão gorda! Eu era bonita! Mas nasceu a Anita e eu engordei. Meus peitos ficaram enormes, minhas pernas incharam. Ele não olha mais pra mim. Ele não me ama mais. Ele ainda é um homem bonito. Tem só vinte e seis anos.
Pedro olha para Célia. O que estou fazendo com ela? Sempre foi dedicada. Cuida da Anita como um anjo. Não me cobra nada. E eu... que merda! Por que faço isso? Por que continuo a fazer de minha vida um fiasco?
O pai de Pedro dizia esse menino não vai dar em nada, é muito irresponsável! Ele mentiu? Ele se enganou?
Célia se levanta: vou fazer o café.
Pedro pensa em dizer alguma coisa engraçada, mas... Célia, eu não estive em nenhum puteiro, tá? Foi o Roberval que me chamou prumas cervejas e eu perdi a noção do tempo...
Esse Roberval tá te desencaminhando! Toma cuidado, Pedro!
Ele é meio doido, mas não faz mal a ninguém... Aposto que a mulher dele acha que eu é que estou desencaminhando ele...
Célia ri sem graça.
Pedro sente uma lufada de sossego no corpo. Tenta se levantar, ainda tonto. De repente, desequilibra-se, vai cair!
Célia o apóia. É uma mulher forte. Ele não cai.
Hoje é sábado, Pedro. Vai descansar! Eu cuido das coisas aqui em casa...
E Pedro penseiro: eu sou um merda mesmo!