Na sala de espera

A vontade de pôr o aparelho ortodôntico sempre fora maior que o poder de pagar. Os dentes encavalados, por vezes, encadeavam sorrisos furtivos. A esperança de uma risada frouxa era quase inexistente. Ser taciturna era conseqüência dos caninos.

Após muito espernear, ganhou de presente o tão desejado aparelho, que veio junto, claro, com os maçantes apelidos. Mas isso não reprimiu a alegria da menina que sonhava com o futuro cheio de dentes.

As manutenções eram constrangedoras. O dentista, um homem com mais idade, alto, caucasiano, cabelos quase grisalhos, com ar afável, e com as mãos mais brancas e grandes que ela já vira. Um profissional que agia com afinco no trabalho, mas que também fazia dele, uma arma de sedução. Ele sabia que era bonito, as clientes também sabiam.

A sala de espera mais parecia um instrumento musical, que saiam notas de suspiros diversos. Tinham as que suspiravam de carinho, de tesão, pela beleza, outras até por amor. Havia aquelas que inventavam dores em troca de algumas horas com ele.

É verdade que já tinha ouvido esses boatos, pensei realmente que fossem só boatos. Da primeira vez que sentei naquela cadeira, tudo era novo, estava ansiosa, não sabia muito que esperar, tinha medo. Ele, confirmando as histórias, me tratou carinhosamente, educadamente, atenciosamente, qualquer outro adjetivo bom + ente, bem!

Não era sua culpa se as tolas se desmanchavam de amores por ele. Era o jeito dele, infelizmente, o jeito de se fazer apaixonar.