O RETORNO
Chegaram as férias de 1956 e com elas a alegria de viajar. Imaginem que eu retornaria a Brejo Santo, iria passar alguns dias na casa de vovó Luzia, iria rever, após dois longos anos, meus fa-miliares e amigos tão queridos. Quanta emoção! Quanta ansiedade!
Na boléia do caminhão, entre o motorista e papai, saí de Serra Ta-lhada em direção à minha terra natal, onde retomaria o curso da minha vida, naquele torrão tão amado, entre as pessoas que sempre fizeram parte do meu universo. É bem verdade que já não seria igual, pois havia ficado no Paraná a maior parte da minha família paterna, especialmente vovô Zé Denguinho, por quem eu nutria muito amor e um carinho todo especial. Em meio àquele redemoi-nho de sentimentos eu me perguntava: por que deveria ser assim? E adormeci apoiada ao ombro do meu pai, vindo acordar quando en-trávamos em Brejo Santo, ao chamado dele. Que alegria! Parecia inacreditável! Eu estava na minha terra tão querida. A emoção foi imensa ao rever minha avó, meus padrinhos, meus tios, meus pri-mos, meus amigos... todos e tudo enfim.
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No dia seguinte recomecei onde havia interrompido há dois anos atrás. No fundo do terreiro da casa da minha avó, estavam os mesmos pés de turquilhas, o riacho amigo, o pé de juá da cancela, a roça do curral, os coqueirais, as mulheres lavando roupas, acocora-das, a cacimba do boi logo adiante e o sítio de Mariquinha Nico-demos mais além... Tudo igual, exatamente como antes. Retomei com meus primos e amigos as brincadeiras costumeiras. Após uma pausa, o tempo continuava o seu percurso como se nada houvesse acontecido. Porém, eu, já não era a mesma; dentro de mim, algo havia mudado. As separações, as perdas haviam deixado feridas, mágoas e até ressentimentos que o tempo se encarregaria de curá-los. Não só o tempo, mas também o reatamento dos relacionamen-tos e a oração, sobretudo.
Não voltei mais à Serra Talhada. Terminadas as férias, minha família havia vindo morar em Brejo Santo. Voltamos para nossa casa, onde até então estava morando a família de Tio Expedito.
Mamãe estava muito feliz, pois voltar a Brejo Santo era o seu maior desejo.
Lá estávamos novamente entre nossos vizinhos.Porém a minha amiga Mariínha não morava mais com o seu avô Manoel Simplício; havia ido morar com seus pais. Que tristeza, para mim! Quanta saudade! E aquele vazio impreenchível?! (mais tarde, quando éramos adultas, já casadas, nos reencontramos. A alegria durou pouco, ela foi arrebatada aos céus em conseqüência de um acidente).
A mesma casa, a mesma praça, o mesmo comércio, a mesma rodagem, os mesmos vizinhos. Seria um sonho? Não!!! Era a mais pura realidade.
E o Ludovico, como estaria? Fui revê-lo.À distân-cia já vi a casa, no alto. Emocionada, lembrei-me de todos os meus familiares, dos amigos e dos momentos felizes que ali partilhamos. A vida continuava como antes. O tempo pare-cia ter parado à minha espera. Que alegria!!! Estava novamente en-tre meus tios e primos e todo aquele pessoal amigo.
Que surpresa! Na estrada surgiu, de repente, um burro com a carga nos cambitos, tangido por Odé. Jamais o esqueceria, pois ele era, e é inconfundível. Com seu chapéu de palha com aba gi-gantesca, que mais parecia uma latada, protegia o seu rosto do sol, e com seus chinelos currulepes, de couro, protegia os pés dos sei-xos da rodagem. Com sua maneira de falar mansamente, conquis-tava a todos, especialmente as crianças.
Meu Deus! Tudo continuava como antes, só eu não era mais a mesma.