Oração para atravessar um dia letárgico

Tem um caminho estranho à minha frente, longo e tortuoso, mas ainda assim iluminado e atraente. O verde das folhas são cristais de pensamento descompassado. Algo que não se desfaz com um simples retomar de consciência. Florestas desconhecem sanidade, seja qual for. Seja a realidade-labirinto. Seja os sonhos-sem-caminho ou, ainda, o realizar-ultra-sentidos. Passo pelas frestas do cotidiano conformante. Sou eu no caminho, mas me perco dia desses. Vez em quando vejo placas: "festa", "tristeza", "vela", "esconderijo", "liberdade", "solidão", "êxtase", "oleosidades", "oniricidades", "praxis", "glória", "espaços entre", "não entre", "último andar" (preciso ir ao último andar). Algumas coisas eu amarro em um fio de cabelo branco, outras eu deixo esquecidas no meu peito. Nada disso é meu, nem os caminhos, apenas amarro com fios de cabelos que tiro da cortina e abimos de detrás da cortina que roubo e guardo para um dia, quem sabe, me lançar. Às vezes toco e vejo, nas pontas dos dedos sem vinhas novas e sem sal, quase-lembranças recentes, na boca sinto o gosto. Sou o maestro, sou a música, tenho tudo que não preciso e deliro tudo que me alucina. Nada disso é meu, mas o que importa? Eu sou o caos e o caos está em todos e em tudo, afinal, até em cristais a matéria duvida de si, refém do meu desenfreado movimento. Por isso não acredito em coisas ditas sólidas nem em algo além das palavras etereamente não-ditas. Só me vejo e só amo em encruzilhadas de entrelinhas celebrantes do orgasmo universal. Em nome dos pais, filhos, putas-amantes, musas e espíritos insanos.