A Arte de Dissimular
Quando criança, ele viveu uma experiência que o marcou para sempre.
A campainha da escola soou e a criançada saiu correndo para o recreio. Ele, sabendo que a fila da cantina sempre era grande, apressou o passo, buscando ser um dos primeiros. Se assim conseguisse, daria tempo de comprar o lanche e ainda jogar uma bolinha com os colegas. Entretanto, quando chegou, pelo menos umas cinqüenta crianças já estavam enfileiradas a sua frente na fila do caixa. “Fazer o que?” Pensou.
Com paciência permaneceu esperando a sua vez, e quase que automaticamente colocou as duas moedas grandes na boca e ficou brincando com elas. Esse era um péssimo hábito, inúmeras vezes censurado pelos pais. Mas não tinha jeito, ainda que ele mesmo se envergonhasse da mania, não conseguia se livrar dela. A fila demorou a andar, e ele, distraído, se divertia com as moedas na boca. Até que, quando havia apenas dois colegas a sua frente, acabou engolindo uma das moedas. Além da dor e do susto, com um frio na barriga, lembrou-se que acabara de desinteirar o dinheiro e que não teria o suficiente para comprar o lanche. Sem graça, saiu da fila depois de esperar aquele tempo todo. O colega que estava atrás dele estranhou e perguntou:
– “Tá chegando a sua vez, não vai comprar o lanche, não?”
– “Perdi a fome, não estou mais com vontade de comer” – falou de modo convincente, sem que ninguém percebesse o verdadeiro motivo que o levara a desistir da fila.
Foi assim que aprendeu a dissimular, arte na qual se aperfeiçoou. Todas as vezes que era pressionado se safava não falando a verdade. Habilidosamente, sempre escondeu as verdadeiras razões, passando outras impressões. Para se salvar, manipulava a realidade, a fim de que pensassem o que ele queria.