O Caso do Acaso
Um sujeito vinha andando apressado pela rua (metido em um terno escuro) quando percebeu que seu sapato estava desamarrado.
A moça que vinha atrás estava distraída, não o viu agachado e tropeçou derrubando todos os papéis que estava carregando.
O homem sugeriu grosseiramente que ela devia prestar mais atenção por onde andava, terminou de fazer o laço no cadarço e seguiu seu caminho sem perceber que ao se levantar um papelzinho dobrado ao meio tinha caído de seu bolso.
Um mendigo que tinha presenciado a cena toda de dentro de sua caixa já ia se levantando para ajudar a moça com os papéis quando um rapaz que vinha de encontro a ela o fez e, por acaso, acabaram ambos descobrindo o amor.
O mendigo, ao perceber isso, ficou feliz por não atrapalhar tentando ajudar. Levantou, pegou o papelzinho do chão e partiu em disparada na direção do homem de terno, parado a alguns metros adiante no ponto de ônibus.
Quando chegou, tocou-o de leve por sobre o ombro, um sorriso podre, desdentado e sincero no rosto, feliz por ser útil.
Foi empurrado e caiu sentado perto de um banco. As outras pessoas que também estavam no ponto demosntraram sua aprovação ou repúdio ao gesto brutal através de pequenos movimentos e comentários.
O mendigo, ainda no chão, assistiu ao homem engravatado entrando no ônibus e limpando com as costas da mão e uma expressão de repulsa a parte do terno onde ele tinha encostado. Já estava suficientemente acostumado com esse tipo de coisa para esquentar um pouco que fosse sua cabeça cheia de piolhos.
Resolveu dar uma espiadinha no papel antes de fazer uma bolinha com ele e atirá-lo na lixeira mais próxima, o que ele achava que todas as pessoas civilizadas deveriam fazer.
Ao desdobrar o papel o mendigo sorriu novamente. Um sorriso sincero, porém muito provavelmente um dos últimos adornado por seus cotos de dentes podres e escuros.
- Querida, GANHEI NA LOTERIA! - berrou o homem do terno assim que entrou em casa mas, por acaso, o bilhete premiado não estava mais em seu bolso.
FIM