O HOMEM DE PERNAS BAMBAS

O vai e vem de pessoas é intenso, diversos rostos desconhecidos transitam entre os grandes edifícios que os cercam. O centro antigo da cidade é cortado por várias ruelas, que são chamadas de calçadão.

Apesar da ausência de automóveis, existe um congestionamento monstro formado por pessoas que passam apressadamente em direção ao seu destino. Porém, existem os que em meio a esse tumulto, tiram seu sustento. Nesse caso em especial, seu destaque perante a massa é notável, pois lá se encontra ele; firme, se equilibrando habilmente em suas pernas-de-pau.

Divulgar promoções. Essa era a honrosa profissão do nosso anfitrião. Todas as manhãs, por volta das oito horas, lá estava ele, vestido com sua fantasia de palhaço equilibrista. Em frente a alguma loja que o contratara, passava o dia tentando atrair a atenção dos apressados que por ali passavam.

A disposição, a vontade, a meiguice, e por que não, as brincadeiras feitas por aquele gigante, eram dignas de prêmio. Pois, como se não bastasse a dificuldade de estar sobre pernas, que a qualquer momento poderiam lhe trair, levando-o ao solo. Ainda, tinha por obrigação, agüentar todos os "elogios" rasgados contra sua integridade, tanto moral, quanto emocional.

- Esse sim leva a vida, tanto veado querendo e esse em cima de dois pau!! Grita algum perverso em meio a multidão.

- Ei!! Palhaço!! Num vai armá a tenda não!! Exalta outro bobalhão.

Dessa forma ele passa o dia se equilibrando, tanto emocionalmente, quanto em sua função. Terminado o expediente de trabalho, já passando das dezoito e trinta, dez horas e meia depois de começar sua labuta, lá está ele. Agora não mais um equilibrista, e sim um apressado que corta as ruelas em busca de condução.

O retorno diário a sua casa, ou melhor, casebre, que fica a vários quilômetros do centro é demorado e cansativo. Metrô e ônibus, todos completamente lotados. Já passam das vinte horas e ele consegue finalmente entrar em seu lar.

O ranger do portão, desperta seu melhor amigo, que de imediato, levantasse e corre em sua direção para recepcioná-lo com grande carinho.

- Vai deitá! responde nosso exausto anfitrião.

Entrando em casa, é recebido com todo calor e amor que esperava receber desde as oito da manhã, quando começara sua jornada de trabalho.

- Pai! Vamos jogar bola? diz um garoto que de tanta felicidade, possui um brilho intenso em seu olhar.

- Desculpa filhão! Papai tá com as pernas bamba! Não é fácil passar o dia se equilibrando em cima daquelas pernas.

Após um rápido jantar e alguns minutos de prosa, nosso anfitrião, desaba na cama e dorme um sono profundo. No entanto amanhã as cinco horas, ele acordará e seguirá seu destino; "equilibrar-se para sobreviver".