O MENINO E A CAIXA
Já não havia mais luz natural, o cair da noite acontecera há algum tempo. O abrir do portão alardeia a mãe, que na janela da cozinha observa seu filho entrar com sua inseparável caixa no quintal.
O vira-lata, animal de estimação da família, antes mesmo da mãe, já notara a presença do garoto. Mal aberto o portão, o garoto é surpreendido com os saltos de satisfação do cão. Um rápido agrado durante o trajeto até a porta da cozinha, e pronto, estava dentro da casa.
- Boa noite filhinho! Deixa essa caixa aí mesmo! Vem jantar!
- Calma mamãe! Irei deixá-la no meu quarto para depois prepará-la. Aí sim, irei sentar para jantar.
- Há, há, há! Não antes de lavar a mão danadinho.
Apesar da pouca idade, oito anos, o garoto possui um grau de amadurecimento precoce. Seu papel como único homem da casa, já que sua mãe foi abandonada no altar, carregando-o no ventre, foi compreendido muito cedo.
Minutos depois o garoto volta a cozinha, mão lavada, cabelo penteado, então exclama.
- Vamos mamãe! Faz meu prato!
De imediato a mãe abre as panelas, e com um prato na mão, coloca uma boa quantidade de comida. Arroz, feijão e bolinho de arroz, era esse o cardápio daquela noite. Aliás, de cada 10 dias, em 5 tinha os bolinhos, que eram feitos com o resto de arroz misturado com farinha de trigo, ovos, leite e salsinha. Dos 5 dias restantes, em 2 dias tinha sopa de feijão.
Mal o prato foi colocado sobre a mesa, o garoto devorou-lo incansavelmente.
- Calma filho! Assim você engasga.
- É a fome! Meu estômago estava grudado nas costas.
Terminado o jantar o garoto sentou em frente a televisão. Enquanto isso, equipava sua caixa para o dia seguinte. Verificado todos os itens, o garoto coloca a caixa perto da porta, deitando-se em seguida no sofá para terminar de assistir seu programa de televisão favorito.
Após uma hora, sua mãe entra na sala e o encontra dormindo. Delicadamente ela o pega no colo e leva para sua cama. Seu sono era pesado, ele acordou apenas no dia seguinte, quando seu cachorro avançava. Era a charrete do leiteiro, o vira-lata sempre ficava maluco com o trotar do cavalo.
Um sobressalto e o garoto já estava de pé, essa era sua hora. Apressadamente ele vai até a cozinha onde a mãe o aguardava com o café pronto. Um copo com leite depois, o garoto já apanhava sua caixa e saia em direção ao portão.
Esta era mais uma chance do vira-lata matar sua saudade. Pulo daqui, pulo dali, e em poucos instantes o garoto chega ao portão. Arruma sua caixa nas costas, partindo para mais um dia como engraxate.