Amores Anônimos

Nada havia de especial naquela ocasião, apenas mais uma tarde quente em uma cidade qualquer, desconhecidos compartilhavam o pouco espaço e a companhia - quase sempre silenciosa - dentro de um ônibus de curto trajeto. Lá estava ela, tão anônima quanto os demais, apenas pensando em sua vida durante o intervalo entre uma rotina e outra. Sua mente vagava preguiçosa, acima das nuvens, quando o reflexo acobreado dos cabelos de outro passageiro chamou sua atenção. A maneira como a luz do sol o tocava, delicadamente, refletindo em sua pele e em cada fio de seus cabelos e da rala barba que cobria seu rosto. Seu estupor durou apenas alguns segundos, pois seu objeto de admiração percebeu que estava sendo observado. Seus olhares se encontraram e ele sorriu.

Ela desviou o olhar, envergonhada por ter sido flagrada e por ver que os olhos, mesmo por trás de lentes de óculos, eram ainda mais belos do que poderia supor e sentiu que seu sorriso teria o poder de fazer seu coração parar.

Nos instantes que seguiram, um flash atravessou sua mente e ela imaginou a vida que teriam acaso viessem a se conhecer, apenas uma bobagem pois provavelmente havia alguém esperando por ele, assim como havia alguém que esperava por ela.

Desembarcou e caminhou sem pressa. Havia se apaixonado à primeira e à última vista, tinha consciência de que nunca mais veria aquele homem mas algo muito maior havia acontecido dentro de si. Fechou os olhos e sorriu, havia descoberto e participado do pequeno segredo dos amores anônimos que nascem e morrem todos os dias.