Opala Comodoro

Por volta das duas horas da manhã resolvemos, meio a contra gosto de Paulinho, dar por encerrado aquela comemoração que já durava desde as sete da noite, regada à Brejo dos Bois.

Mas, Paulinho queria mais, afinal não é todo dia que se consegue realizar um sonho de adolescente e, neste caso, era Opala Comodoro preto. Até que eu entendia tanta euforia, mas não sou engenheiro, não me dou o luxo de trabalhar só até a sexta... Tinha muito trabalho me esperando no meu comércio de bairro que não para nunca!

Deixei Paulinho todo empolgado dizendo que ainda ia esticar, “dar uns pulos” e segui meu rumo.

Manhã de sábado e estou eu com aquele gosto natural de quem mastigou borracha (qualquer um que já tenha sido vitima da embriaguês sabe do que estou falando) e o telefone já começou a tocar.Uma ligação atrás da outra. Sinceramente, pensei, não acredito que Paulinho já está de pé e me perturbando para sair. Mas, estava.

Quer dizer, para sair não, mas perturbou um bocado para que eu fosse vê-lo. O cara parecia mal. Dizia ele está com uma ressaca física e moral. Confirmei a visita.

Ao final do trabalho, fechei a loja e fui vê-lo. O cara estava o oposto da noite anterior, nem me olhava direito. Comecei a ficar preocupado e isso só passou quando Paulinho abriu a matraca e desandou a falar como quem ler um texto de quinhentas palavras na razão de 15 segundos para um comercial de televisão.

Depois que o deixei naquela noite, Paulinho disse ter dado umas voltas na Ponta Verde, Pajuçara e aí achou por bem, pelo adiantado da hora, ir pra casa, no Farol. Mas quando ia começar subir a Ladeira da Antiga Rodoviária, viu no ponto de ônibus e não acreditou (nem eu estava acreditando): sozinha, uma linda e jovem mulher, vestida de branco... uma noiva desconsolada!?

Pensou, então, que mal há em dar atenção a essa jovem que, pelo jeito, deixou o noivo à espera no altar.

Parou o possante ao lado da gata e cheio de solidariedade ofereçeu-lhe carona.

Acreditei menos ainda quando ele disse que, nem bem trocaram duas palavras (que ele não recordou quais) e já estavam ambos entregues um ao outro numa tórrida e cinematográfica noite de amor.

Bom, se tudo aquilo era verdade, porque Paulinho estava tão sem graça? Por outro lado, se era fantasia... ôxe... eita cachaça do cabrunco!

Ai, ai...

Por mais que gente ouça estória de caçador, pescador, as de bêbado, ainda mais metido a raparigueiro, são insuperáveis...

Pois não é mesmo que Paulinho encontrou mesmo a caminho de casa uma mulher vestida de branco, sozinha, desconsolada, num ponto de ônibus a esmo na madrugada; pois não é que os dois foram aos “finalmentes” e que fora fantásticos os múltiplos orgasmos (ah, isso dito por conta e risco do dono do Opala).

O detalhe resumia-se apenas no fato de a mulher não ser tão jovem assim, próximo de seus sessenta anos, e não era uma noiva, mas uma mãe-de-santo que vinha de um trabalho as margens da Praia da Avenida e estava naquela parada esperando o Circular.

Foi inevitável perguntar: Paulinho, você está com preconceito por que ela é de outra religião ou por que ela tem mais idade que você?

Meu amigo aos prantos, inconsolável, respondeu: Que merda nenhuma de preconceito!... Eu estou é puto porque emprestei o Opala para ela ir embora hoje pela manhã e não sei nada dela, nem nome, nem celular!...

Que experiência: é triste, muito triste, ver um homem chorar pela falta de seu Opala Comodoro.