Eva Maria
Eva Maria sempre teve uma personalidade forte. Nasceu sabendo o que não desejava da vida; filha de mãe prepotente e pai submisso. Eva Maria era uma mocinha bonita, culta e educada. Casou com o primeiro namorado, mas não foi o único. Foi pedida em casamento três vezes, mas aos quinze anos ela chegou para a futura sogra, pessoa que acabara de conhecer, e vaticinou: eu vou me casar com seu filho. A senhora em questão, como não era boba, e era muito ligada ao filho caçula, que é bem provável que tenha sido conseqüência do último canto do cisne, respondeu: com esse não, case com o irmão dele. Que era mais velho e traste. Eva Maria estava decidida; namoraram sete anos. Eva esperou o moço estudar e começar a trabalhar. O casamento foi tão lindo que até hoje se comenta a suntuosidade da igreja e o vestido na noiva em estilo medieval. Eva Maria se manteve virgem como convinha a uma moça da época. A avó comentava, menina deve merecer o véu. Pois ela mereceu, só não mereceu o que veio depois, mas isso é outra história. O começo do casamento foi igual a todos, muita luta, juntaram miséria com miséria. O noivo não era rico. Eva Maria era rica, mas era tudo emprestado. Quando casou não levou nem suas jóias pessoais. Sua mãe ficou com tudo e como não era muito, Eva Maria não deu bola. Até o enxoval de Eva Maria acabou voltando, aos poucos, para a casa de sua mãe, principalmente as toalhas de banho que ficavam esquecidas na casa da mãe e nunca mais voltaram. Aliás, a mãe de Eva Maria sempre foi fascinada por toalhas de banho que não eram dela. Deve ser algum fetiche da distinta senhora. Eva Maria, por conta das dificuldades, logo começou a costurar seus próprios vestidos e sempre com muito bom gosto. Ela sempre gostou de andar na moda, o corpinho ajudava e as medidas de miss. Tudo lhe caia bem. Eva Maria teve roupas que ficaram na história, não digo as roupas de festas que eram fabulosas, mas o dia a dia também. Nos anos 70 foi moda macacão, pois Eva Maria mandou confeccionar um macacão de malha preto, estilo segunda pele, e duas saias que sendo uma verde de bolas pretas e Eva Maria arrasou. Quando chegaram os filhos, Eva Maria passou a costurar para a família, foram anos de lutas e por conta de Eva Maria ganhar dinheiro na hora do aperto, pois Eva Maria pintava peças de gesso e vendia. Pintava como ninguém máscaras venezianas e os presépios, então... Pareciam verdadeiras obras de arte. Ela não saía vendendo, ela largava na mãos das manicures que se encarregavam das vendas e ainda faturavam um dinheirinho extra. Fabricou tantas flores para vestidos que certa ocasião admirando sua pinacoteca ficou maravilhada pois a maioria de suas telas foram fruto do seu rico dinheirinho. Depois Eva Maria passou a ganhar muito dinheiro. Com os filhos já crescidos dava festas de arromba. Da decoração aos comes e bebes tudo por sua conta. Enfeitou a casa e a vida. Abriu um canil e passou a vender cães de raça rara, pois seus canil era muito conhecido e conceituado. Montou fábrica de vestuário e foi um sucesso. Com o dinheiro ganho bancou baile de debutante, festa de 15 anos, a vida social intensa dos filhos, colégio dos filhos, e passou anos sem depender de um tostão do marido. O que é curioso é que o marido de Eva Maria tinha uma teoria muito própria a respeito do dinheiro. Tudo que era dele era dele e o que era de Eva Maria também era dele, mas Eva Maria nunca se preocupou muito, sabia que se bastava. Enfeitou a casa, a vida, filhos e fez deles gente. E o marido, cansado de uma mulher tão eficiente, partiu para o território alheio e arranjou uma amante com nome de santa que logo foi trocada por outra com nome de filha da outra. Resultado, a santa revoltada ligou para Eva Maria e contou tudo, tudinho. Eva Maria chorou, esperneou, e pensou até em arranjar uma galharia de alce para ele. Até já se imaginava dando assunto para a cidade. E a cidade inteira se dirigindo a ele, como vai dr. Alce? Dona Eva Maria já trocou a porta para o senhor passar? Imagine o tamanho da galharia. Mas como ela tem muita personalidade, achou que essa vingança seria muita baixaria com os seus filhos e deixou o dito pelo não dito. Ela suportou com muita elegância a sua galharia. É a dignidade das mulheres traídas. E não foram mais felizes para sempre.