A natureza é bela

Este episódio, protagonizado pelo meu filho Samuel, na época com aproximadamente dois anos de idade, aconteceu no município de Braganey, distante aproximadamente 30 Km de Cascavel no Paraná, mais precisamente num dos riachos que permeiam o município e preencheu sobejamente um ensolarado dia de verão, janeiro de 2003.

Reunimos alguns familiares para um planejado piquenique nas margens do riacho: juntadas as tralhas, comprados os víveres, apetrechos de pesca e camping, para lá rumamos, em uma caravana de quatro ou cinco veículos, nestes estavam pais, irmão, avós, tios, primos (em todos os graus), agregados e, claro, o Samuel.

Chegamos ao lugar muito cedo, enquanto se dissipava a cerração, aquecida pelos primeiros raios de sol, prenunciando um maravilhoso dia quente e ensolarado, chamava-nos a atenção as árvores altas de troncos encorpados e copas exuberantes, algumas se debruçando sobre o leito do rio, em todo seu sinuoso curso, alvejado aqui e ali por pequenas frutas, -araçás, amoras, pitangas -, arremessadas pelas árvores, levemente agitadas por uma brisa suave e intermitente, a mesma que nos fazia sentir o aroma perfumado de flores silvestres.

Estacionados os carros na entrada da fazenda, descemos uma pequena ribanceira, adentrando no bosque, escolhemos o melhor lugar para armarmos as redes, as esteiras e definimos o local onde deveríamos preparar o lanche, para aquela hora em que os chamados bucólicos da natureza já não se sobrepõem ao instinto descolorido da fome.

Com muita dificuldade conseguimos segurar as crianças o tempo suficiente para besuntar-lhes o corpo com protetor solar, antes que seguissem em disparada para o riacho, como que enlevados pela música composta pelo som de suas águas, transparentes e frias, arremessadas de uma riba sobre as rochas, formando uma bela cachoeira, visitada de quando em quando por uma furtiva andorinha ligeira.

Pois foi nesse cenário de indescritível beleza que percebi, surpreso, que o Samuel mal entrou e logo saiu da água, se recusando a entrar novamente, mesmo após minha insistência, sem me dizer, contudo, qual era o motivo.

Suspeitando de que estivesse com medo, tomei-o nos braços e entramos junto no rio; como parecesse resignado brincamos juntos por alguns momentos, afundávamos na água, nos abraçávamos e riamos muito.

Porém, percebi que sempre que procurava conduzi-lo para a outra margem, ele se mostrava desconfortável e me puxava de volta.

Procurei observar bem a outra margem, nada enxergando de anormal, apenas notei que permeavam aqui e acolá grandes pedras vulcânicas, quase arredondas pela ação do tempo e das águas, cobertas de pequeninas conchas de moluscos aquáticos, que lhes davam um aspecto de grandes biscoitos de chocolate, que com alguma imaginação poderia ter sido ali derrubas, ou "ugh" expelidas, por algum gigante distraído (lembrem-se do livro: as aventuras de Gulliver).

Foi então que lhe perguntei:

- Filho, por que você não quer ir para lá comigo?

- Ô pai, olha lá, você não esta vendo os “cocozão”?

Bem, pelo sim ... pelo não, também não fui mais à outra margem do rio!

P.S.: Para minha surpresa, um ano depois (2004) o prefeito de Ponta Grossa Péricles de Mello (PT) inaugurou um monumento chamando Campos Gerais, que o povo logo batizou de "Cocozão".