Sedução No Lotação
Ela usa um broche que não brocha ninguém, muito pelo contrário. Entra no coletivo, passa pela roleta e senta na frente do escolhido do dia, ou melhor, da tarde, sempre entre catorze e dezesseis e trinta horas, quando o movimento de passageiros é mais discreto.
Senta com seu cocuruto na frente do olhar do passageiro. Ninguém consegue ficar indiferente tendo ao alcance dos olhos o arreganhado voluptuoso do broche. Longe de ser uma bijouteria comum, é cercado de pequenas pérolas brancas alternadas com outras de cor rosa choque.
Uma verdadeira provocação libidinal: os grandes lábios do broche lembram os grandes lábios do vinco rechonchudo de uma mulata depois do décimo parto. Um escândalo para alguns usuários, um deleite para outros.
O certo é que a jóia provoca sempre um olhar, devido ao esbugalhado debochado do broche.
Conhecida pelos passageiros da linha Ana Rosa - Freguesia do Ó, como a Bela da Tarde, a mulher chama a atenção das outras primadonas que, não raro, comentam indignadas umas com as outras, falam, não tão baixo: "Que pouca vergonha". Isso porque gostariam de ser, cada uma delas (por isso censuravam a "Bela da Tarde"), a principal atriz da companhia do ônibus naquele horário. Comentários não faltavam:
—Simplesmente imoral.
— Revoltante.
—Que indecência.
—Quer aparecer!
Sempre aparece alguém do sexo masculino com uma palavra de apoio à escandalosa vagina suspensa entre os cabelos posteriores da cabeça da bela dama:
— Não é a moça que é indecente, é o broche.
Com freqüência o cara sentado atrás do banco da dama do broche costuma ficar meio mesmerizado com o visual kitsch, algo pornô, do inusitado adereço a segurar os cabelos da moça no estilo rabo de cavalo.
A atração por vezes é tão sedutora, que o passageiro do banco de trás não resiste ao visual da vulva oferecida bem ali, sem pudor, ao alcance da mão, e estica o dedão rumo a um contato mais íntimo com essa abertura convidativa e cabeluda no alto da cabeça da garota.
O passageiro mais afoito e embevecido pelo visual erótico cede ao impulso irresistível de roçar a ponta do dedo na abertura vaginiforme dessa jóia rara, visando sentir alguma sensação tátil mais íntima, mas só consegue o contato com a dureza dos delicados dentes do broche que prendem os cabelos macios, acidentalmente vaginais e bem pentelhados, do rabo de cavalo da dama do broche.
A visão luxuriante da freudiana jóia, balança ao sabor das idas e vindas do ônibus, das freadas e arranques bruscos do motorista, no vai-e-vem dos passageiros nos bancos. A dama, ocasionalmente, como quem vai ajeitar o penteado, apalpa delicadamente os grandes lábios laterais do mesmérico e decorativo adereço, pressionando de leve os dedos para os lados como querendo deixar mais à mostra o interior da bela vulva ornamental.
Tem voyeur que fica doidão, não resiste ao desafio libidinoso: é como estar vivendo um filme pornô ao vivo. A dama está ao alcance da língua. O passageiro contumaz aproxima afoitamente a boca da pseudo abertura da bela da tarde e desfia o linguão rumo ao atrativo pentelhudo e irresistível.
O motorista freia, como sempre, bruscamente, e o audacioso gesto compulsivo do fã dos encantos da bela do lotação, termina com dois dentes quebrados e o lábio inferior sangrando, após o impacto do rosto no apoio de ferro do banco onde estava a se segurar com uma das mãos.
Mais um incauto voyeur meteu a mão pelos pés exposto aos encantos da Bela do Lotação.