shilep, shilep, shilep...

Mesmo na madorna, ouço o shilep, shilep do chinelinho no corredor. Se tivesse poderes mágicos, com a força do pensamento colocaria rodinhas naqueles chinelinhos e tiraria a parede do fundo do corredor, com o quadro da Monalisa e dava um empurrãooooooo.......

Claro que tudo com a força do pensamento. Isso ia me dar aí, pelo menos mais meia hora de sono, até que chamassem o resgate, até descobrir o que aconteceu, etc, etc, etc... Mas eu não tenho poderes mágicos, então o chinelinho pára na frente da porta do meu quarto e grita:

_Seis horas!

Cobrindo a cabeça com o travesseiro,finjo que não ouvi. Mas ouço a porta abrir e o chinelinho caminha na direção da minha cama. Se eu tivesse uma metralhadora, usaria ela agora mesmo contra esse chinelinho insistente. Mas meu pai dizia que na nossa família não era bom ter arma de fogo em casa. Agora entendo bem porque. Prefiro então tirar mais um cochilinho enquanto o chinelinho conta até dez ameaçando me derrubar da cama.E lá vem ele impiedoso, shilep, shilep,shilep e puxa meu precioso cobertor, sem o qual, não consigo viver.

_Levanta menina! - grita o chinelinho num tom ameaçador. Ordens de mãe é melhor não discutir, porque mãe, delegado e freguês sempre tem razão. Freguês você ainda consegue engambelar, delegado é fácil negociar é só ligar pra mãe que ela resolve tudo. Mas mãe quando encasqueta... não tem delegado, não tem ninguém que tira da cabeça dela o que quer que seja. Mas voltando ao assunto, sem o cobertor, fico em posição fetal, desesperada, em pânico porque agora eu sei exatamente o que vai acontecer. A sacudidela inevitável, impiedosa, insuportável. Meu corpo parece que ainda tem sono para mais 3 dias. Ainda deitada, sem me sentar na cama, ponho um pé no chão, depois o outro e escorrego o resto do corpo, devagar. Vou me arrastando até o banheiro, como uma ameba gigante. Sento no trono pensando em tirar mais um cochilinho, mas mal fecho os olhos e ouço o shilep, shilep do chinelinho. Desta vez ele não pode entrar a porta está trancada e novamente penso naqueles poderes mágicos que gostaria de ter. Só ouço um toc, toc insistente na porta e a pergunta fatal de todos os dias:

_Que demora é essa menina, você não está dormindo no banheiro não, né?

_Não mãe tô indo!

_Mas já passaram 15 minutos, vai perder a hora se apresse.

Depois de um banho me sinto renovada, disposta, feliz. Coloco uma roupa bonita, faço um rabo de cavalo, coloco uns penduricalhos nas orelhas e desço para a cozinha onde me espera um gostoso cafezinho com leite, pão quentinho com manteiga. E minha mãe me recebe com um "Bom dia filha linda ", e me transformo na mais doce das criaturas. E penso: como poderia eu viver sem o shilep, shilep do chinelinho de minha mãe?

Joana Aranha
Enviado por Joana Aranha em 02/04/2010
Reeditado em 12/03/2013
Código do texto: T2173874
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