UM PADRE NO MOTEL

     Equívocos acontecem com todo mundo. No entanto, com o padre foi algo excepcional. Ele havia chegado naquela tarde que antecedia o dia da visita do Papa. Viajara, sozinho, mais de setecentos quilômetros, desde o interior do Ceará até Natal. Estava exausto. Preso entre os dedos trazia um pequeno papel contendo o endereço do hotel no qual ficaria hospedado. A Diocese local havia firmado convênio em que a rede hoteleira concederia um desconto especial. Ele parava aqui e ali e pedia informações que o ajudassem a encontrar o hotel. Por descuido, saiu um pouco da rota e parou em frente a um motel. O pára-brisa do carro, embaçado pela poeira, dificultava a visibilidade. Olhou para a placa e viu somente a palavra OTEL, ficando o M encoberto pela sujeira do pára-brisa. Sem perda de tempo, entrou. Parou na entrada do motel, sendo interceptado pelo porteiro:
     - É verdade que vocês estão com um desconto especial? – Perguntou ao porteiro.
     - É, sim – respondeu o porteiro.
     - Onde fica a recepção?
     - É aqui mesmo.
     - Então, eu quero um apartamento.
     - Pois não. Aqui está a chave: apartamento 113.
     - Onde estaciono o carro?
     - Na garagem do apartamento.
     - Na garagem?
     - Exato!
     O padre seguiu em frente e percebeu que cada apartamento realmente tinha uma garagem. Chegou, enfim, ao apartamento 113. Estacionou o carro, desceu, abriu a mala e retirou a bagagem. Abriu a porta, observou ligeiramente e gostou das acomodações. Retirou a batina da mala. Procurou um armário para guardá-la e percebeu que não existia. Ficou admirado.
     Tomou um reconfortante banho morno e vestiu-se. Sentou-se na cama e ligou para a recepção:
     - Alô! Aqui é do apartamento 113. Por favor, eu gostaria de saber se vocês têm serviço de quarto?
     - Temos, sim – respondeu a recepcionista.
     - Eu gostaria que me trouxessem um sanduíche e um suco de laranja.
     - Pois não, senhor. Aguarde só um momento.
     Enquanto aguardava, ele abriu a porta de acesso para a garagem. Caminhou um pouco até a entrada da garagem à procura de alguma pessoa com quem pudesse trocar algumas palavras. Mas só viu garagens com as portas fechadas; nenhum sinal de um ser humano. Retornou ao apartamento. Ouviu a campainha soar. Dirigiu-se à porta de acesso às dependências internas para abri-la. Depois de várias tentativas sem sucesso, resolveu bater discretamente na porta. Foi inútil, ninguém apareceu. Intrigado com o acontecimento, parou um pouco e pensou:      “ Por que será que fecharam a porta e não deixaram a chave? Ora, se não deixaram a chave como é que querem que eu abra a porta?”. Foi então que ele observou uma pequena janela com um ferrolho, ao lado da porta. Ao abri-la, para sua surpresa, deparou-se com o sanduíche e o suco de laranja. Recolheu-os e antes de fechar a janelinha procurou inutilmente ver alguém.
     Depois de saborear o lanche, decidiu ver a programação das solenidades que ocorreriam no dia seguinte durante a visita do Papa. Percebeu que havia deixado, por esquecimento, na pequena cidade da qual é pároco. Meditou um pouco e achou que seria possível que na recepção existisse algum folheto com a programação. Ligou para a recepção:
     - Recepcionista, por favor, seria possível vocês conseguirem um programa para mim?
     - O senhor está só?
     - Estou, mas amanhã bem cedo deverá chegar o bispo da minha Diocese.
     - Um bispo?
     - Sim. Por que?
     - Não...Não é nada não. Desculpe-me, estou trabalhando aqui há pouco tempo e não estou ainda acostumada...
     - Entendo, mas quanto ao programa?
     - Não se preocupe, aqui nós não temos, mas vou ligar para um pessoal que conseguirá para o senhor.
     - Ótimo, se não for muito incômodo.
     - De forma nenhuma, estamos aqui para ver as pessoas satisfeitas!
     O programa estava demorando. Ele decidiu ligar o televisor, na certeza de que algum noticiário local trouxesse as informações que procurava. Ficou pasmo ao ver cenas de sexo. Desliga-o imediatamente. Antes de reclamar à recepção, alguém bate na porta de acesso à garagem. Ao abri-la, depara-se com uma mulher loura, sorridente, que, sem cerimônia, entra de imediato no apartamento. O padre, perplexo, pergunta:
     - Quem é você?
     - Sou Doris - responde a mulher sem embaraço.
     - O que está fazendo aqui?
     - É...O programa que você pediu.
     - Sim, e onde está?
     - Estou aqui, lindão!
     - O que? Respeite-me!
     - Não se agradou de mim, fofura?
     - Retire-se daqui, pecadora! – Disse, aos berros, o padre.
     A mulher, assustada, retirou-se quase correndo. Ele, irritado, pegou o telefone e ligou para a recepção.Pede para falar com o gerente.
     - Alô, é o gerente?
     - Sou, sim.
     - Que ambiente é esse? Parece até com o inferno!
     - O senhor não está gostando dos nossos serviços?
     - Claro que não! Liguei o televisor e o que vi foi uma porcaria de filme!
     - Mas, senhor, nós temos outros filmes eróticos, é só trocar de canal.
     - Respeite-me. Eu não gosto de ver essas porcarias!
     - Desculpe-me, eu não sabia do gosto do senhor!
     - Para completar, eu solicitei um programa e mandaram-me uma mulher!
     - Não sabíamos das preferências sexuais do senhor!
     - Pois fique sabendo que vou me queixar ao bispo daqui! Nunca pensei que um padre fosse tão desrespeitado! Este hotel aqui é uma verdadeira Sodoma!
     - Padre, o senhor está num motel!!