Dona Luzmarina

Dona Luzmarina, senhora educada, bem nascida, elegante, de uma moral acima de qualquer suspeita. Ela é baixinha, loirinha, de cabelos de caracóis e lindos olhos azuis. Foi casada durante cinqüenta anos com um senhor educado, culto, elegante e lindo, e que amava dona Luzmarina acima de todas as coisas. O casal tão distinto era requisitado para todas as ocasiões, do nascimento ao funeral eles sempre marcaram presença. O ramo deles era hotelaria; uma cadeia de hotéis dos melhores da época. Eles possuíam um casal de filhos tão encantadores quanto seus pais. Dona Luzmarina percorria todos os hotéis da família para ver se estava tudo dentro dos conforme. Fazia questão de ir pessoalmente dar cursos de camareira, de governanta, cuidava da roupa de cama e banho do hotel, que deveria estar sempre impecável. Ela se empenhava e tinha um detalhe: como o marido era um homem muito bonito, ela fazia questão de frisar: ele só tem olhos para mim. E de fato era verdade. Nas bodas de ouro a festa foi linda. O avião particular cruzou os céus com uma faixa com essas palavras: obrigado minha amada Luzmarina pelos cinqüenta anos de felicidade! Eu ate amo! E quando o avião sobrevoou a casa de dona Luzmarina descarregou uma tonelada de rosas vermelhas; eram tantas rosas que dona Luzmarina ficou soterrada e o marido gritava: Luz da minha vida, não, não, não foi essa a minha intenção! E depois de muito procurar, ele quase soterrado, encontrou a luz da vida dele e dias depois ele veio a óbito. Foi a emoção, todos comentavam. Viúva, dona Luzmarina trabalhava nos hotéis em media 16 horas por dia, só para esquecer o seu grande amor. Passado o período de luto fechado, dona Luzmarina recebeu a visita de um filho ilustre da terra, que era juiz de direito. O juiz chegou em casa de dona Luzmarina, ela não se encontrava, mas como o hotel onde ela estava era perto sua casa (casa onde ela morou cinqüenta anos com a família), a empregada foi chamá-la e ela veio correndo com seus passinhos miúdos e o saltinho, toc, toc, toc, toc. Que grande emoção ver o menino que praticamente cresceu com seus filhos e tratou de mandar servir um caprichado lanche e a empregada se esmerou. E conversa vai, conversa vem, dona Luzmarina pediu licença para tão ilustre visitante, e foi conferir se a mesa estava de acordo. Nesse meio tempo, o meritíssimo juiz colocou a cabeça no vão da porta e perguntou: onde é o banheiro? E já foi entrando, pois ele passou a infância brincando com os filhos da dona da casa, da qual ele conhecia todos os caminhos. A mesa estava perfeita para o ilustre visitante, só que ele esqueceu de sair do banheiro. Lá pelas tantas, ela muito sem jeito, mandou a empregada chamar o moço. E foi a empregada se aproximar da porta que esta se abriu e o visitante saiu do banheiro, nu. Isso mesmo, despido, sem roupa, exposto totalmente. Dona Luzmarina dizia: meu filho acho que você esqueceu de alguma coisa. E a empregada correu para apanhar um lençol, mas quando regressou com o lençol ele já estava sentado vis a vis com dona Luzmarina que estava pasma, em estado de choque. E ele lanchando e conversando. Dona Luzmarina, discretamente, chamou a empregada e deu ordens para que ela fosse buscar a senhora tia do meritíssimo juiz pelado. Mas a senhora custou a chegar e o visitante terminado o lanche se levantou, beijou a mão de dona Luzmarina, agradeceu a atenção e o lanche delicioso. Pegou o paletó, a pasta que estava recheada com suas roupas, atravessou o vestíbulo, abriu a porta e saiu pelo lindo jardim. Abriu a porta de seu carro, deu um adeusinho e foi embora. Dona Luzmarina até hoje anda zureta, zureta, e as amigas de jogo perguntam, será que é da idade? Pois ela mudou. Não foi mais cuidar dos hotéis e a empregada está proibida de abrir a porta para qualquer pessoa, sob pena de ser despachada para Deus me livre. Quando dona Luzmarina saía era para ir a missa ou jogar com as amigas, fora o trabalho do hotel. No hotel ela nunca mais apareceu. Jogar ela vai, mas a missa não, porque durante a missa ela começou a ver o padre nu, rezando missa.