Uma Tarde na Choperia

Ô Sapo, traz uma pururuca, amendoins e um maço de Charm aqui pra gente. Tô querendo parar de fumar mas esse vício é do demônio.

Pô Zequinha, cê tá fumando desse cigarro, só puta fuma desse cigarro.

Tô sem dinheiro para continuar no mundo de Marlboro.

O calor é insuportável aqui no interior de são paulo. Eu, Rufus e Zeca recorremos ao bar do sapo para tomarmos uma gelada numa tarde de domingo.

Para de fingir que está falando no celular, Rufus. O negócio hoje é ter carro.

Passava uma bela garota na rua, semi-nua, com as coisas quase pra fora.

Será que minha moto impressiona ? E se eu falar que vim da capital, será que eu consigo um beijinho pelo menos?

As mulheres desse bairro são fresca, Disse Sapo trazendo os amendoins, a pururuca e o Charm de Zequinha. Hoje em dia, elas só querem andar de carro. Estão exigentes, que mulher quer andar de moto pra estragar a chapinha nos cabelos?

Outro dia beijei uma mina lá na festa do Giordano, cê precisa ver que mina da hora. Tinha a pele branca como leite e os dentes mais brancos ainda de tão polidos que era. Andava num salto alto como se fosse uma modelo desfilando na passarela. Coisa mais linda. Quando ela perguntou se eu podia dar carona pra ela, respondi que tava a pé. Cara, cê acredita que a pilantra se mandou atrás de uns Mauricinhos. Pode umas coisas dessas.

Bebemos seis garrafas de cerveja e decidimos ir a uma Choperia na avenida Brasília. O lugar era de bacanas e as madames estariam lá, exibindo o corpo malhado e seus acessórios de valores. Deveriam também estar todas bronzeadas, porque era começo de ano e gente rica adora ir à praia no natal, quando voltam de lá, ficam parecendo peruas assadas.

Vai ter que empurrar, disse Zequinha referindo a sua belina oitenta e três. Só pega no tranco essa geringonça. Empurra aí, merda!

A belina funcionou. Descemos a Duque de Caxias e paramos num semáforo atrás de uma viatura policial.

Esconde essas latinhas aí, meu. Os tiras tão olhando pelo retrovisor.

Essas caras vão enquadrar, cê vão ver só. Tem alguma coisa em cima aí Barbosa. Tô limpo Zeca, eu disse. Se nós tivesse dirigindo um carro do ano esses caras nem olhava pra gente. Eles só fodem com os pobres. Lembra daqueles Mauricinhos que estavam apostando racha lá na Pompeu e deixou um cara paraplégico. Os putos estão soltos ainda. Ninguém prende. Eram dois filhinhos de papai. Cadê a justiça neste país.

Viramos à direita e os tiras foram retos para o nosso alívio.

Vocês tem certeza que quer tomar umas aqui? Esse lugar fica do lado da Policia Federal, isso vai dar merda hein! disse Rufus.

Não esquenta não Rufus, Policia Federal não trabalha de domingo. E outra, não devemos nada pra ninguém.

Claro que devemos. Nós somos pobres. Pros ricos e pros tiras, estamos sempre devendo.

Vamos sentar perto da entrada, disse Zequinha, quero ver as granfas entrando. Reparem só. As metidas ficam paradas aqui na frente fingindo esperar alguém, mas é pura balela. Tão querendo que todos reparem na sua roupa de marca. Aí, quando entram, se sentem mais seguras e rebolam como se estivesse numa passarela.

Depois de dez minutos sentado chega o garçom.

Queremos três chopes. Os mais barato. Ei amigo, aqui também tem aquele negócio dos três por cento de vocês? Tem!, respondeu seco o garçom.

Já vimos que vamos ser mal atendidos, disse Rufus. Também olha pra nós, três pobres de aspecto sujo, usando All Star, cabeludos, dente amarelo de tanto fumar, com trajes marrotados de um algodão sem vergonha e barato.

O lugar ia começando a encher. Nos rostos das pessoas, se viam um orgulho cintilante de quem come e bebe bem servidos de uma cozinheira particular.

Tá vendo aquelas Patricinhas? Disse Zeca. Sabe como elas escolhem namorados? Pelo sobrenome. Você tem que ser um Maia, um Bittencourt, Diniz,Viana, Medeiros, Toledo, um Resende. Tem que ter um sobrenome de prestígio. O cara pode ser um Zé mané, mas tem que ter um sobrenome influente. Pra elas poder chegar na rodinha de amigas e dizer, sabe quem tô namorando? O Viana, Aquele das criações dos Nelores. Pra aquelas alí, não basta só ter um carrão ou um posto de gasolina. Ter que ter sobrenome. Como vai, meu querido Medeiros. Olá, Toledo, como passou o dia na sua bela mansão com a família. É assim que funciona.

Bebemos mais uma rodada de chopes.

Um dia serei rico, disse Rufus. Vocês vão ver só. Vou comer todas essas branquelas cheirosa. Vão me chamar também pelo sobrenome. Olá Candín, vai me levar pra onde hoje? Vamos para o seu iate no porto? Ou vamos pra sua fazenda andar de cavalo e tomar banho de cachoeira?

Ô Rufus, não viaja não, meu. Você nem terminou o ginásio. Como tu vai fazer pra ganhar dinheiro, roubar um banco? Hoje em dia até pra ser ladrão tem que ter diploma. Ó, enquanto isso, faz o seguinte, vai até o banheiro e bate uma punheta sonhando com suas putas de salto alto.

Depois de quinze minutos com os copos vazios o garçom trouxe mais chopes.

Acho melhor irmos embora. Ninguém olha pra nós aqui, nem o garçom se quer olha pra nós aqui.

E se a gente chegar numas dessas aí, disse Rufus. Nós fala que viemos da capital visitar uma das nossas fazendas do interior. As minas vão ficar gamadinhas na gente.

Larga de ser burro, Rufus. Esqueceu que estamos de belina. E outra, você é um Candín, o Zeca é um Silva e eu sou um Barbosa.

Bebemos mais chopes e pedimos porção de pastelzinhos de camarão.

Tive uma ideia, disse Zequinha. Vamos prum puteito. Ficou louco! Zeca, eu disse. Eu só tenho cinquenta mango do meu décimo terceiro que sobrou. Só aqui vai tudo.

Vamos sair sem pagar, disse Zequinha. Se agente sair sem pagar nós faz a festa num puteiro. Come a vadia que quiser. Essas mina daqui tá me dando nojo. O garçom nem atende nós direito. E pior que são pobre como a gente. Lá não tem frescura, nós paga e goza na cara. Lá o dinheiro fala mais alto que aqui.

Zequinha foi ao banheiro, eu saí para comprar cigarro e Rufus ficou na mesa esperando uma oportunidade de fuga. Esse foi o combinado. Eu e Zeca empurramos a belina e deixamos ligada para não perdemos tempo. Rufus chegou e se mandamos de lá. Passamos em frente da choperia e ainda mexemos com as garotas na entrada.

Adeus suas vacas enfeitadas de ouro! Vamos foder com as putas! Vocês não prestam! Não prestam porque dão de graça! Vocês fedem gasolina! Fedem bosta de gado Nelore!

Andamos a cidade inteira e só o puteiro da Geni estava aberto.

Olá, Geni. Quantas tem? Tem três, disse Geni. E não tem ninguém, tá vazio.

Entramos no antro e deparamos com três prostitutas feias, muito feias! Mas feia mesmo!

Nenhum de nós teve coragem de encara-las. Fomos embora de lá e voltamos para o bar do Sapo. Estávamos bêbados, muito bêbados. Mas elas eram feias, muito feias. Feia! Feia! Feia!

É desse lugar que eu gosto, disse Rufus. Aqui me sinto em casa. Arroto, peido, e como os petiscos com as mãos. Aqui não tem frescura, não tem nenhuma regra de classes sociais.

Só de pensar que aqueles filhinhos de papai vão dormir até tarde amanhã.

É... e tem gente que diz que boteco é lugar de vagabundo.

Ô sapo, traz mais pururuca e amendoins aqui pra gente.