UM PREDESTINADO

Um predestinado

Pelos idos de 1958, o seu Olívio Ferreira da Rocha e sua esposa dona Antonieta, viviam como a maioria de seus vizinhos, da criação de algumas cabeças de gado e da lavoura de subsistência, como único meio de sobrevivência nuna fazenda no sertão de Minas.

Apesar de muita labuta, ali reinava uma paz de dar inveja. Até vangloriavam da tranquilidade que pediram a Deus. A vida só não era melhor porque não se conformavam com os filhos crescendo sem escola, sem vislumbrar um futuro pujante.

Seu Olívio e dona Antonieta iam empurrando a vida até onde podiam, mesmo sabendo que se continuassem na roça, o futuro de seus filhos estaria fatalmente comprometido.

Pretendiam vender a propriedade, mas tinham que pensar e fazer contas, pois, o valor da terra naquela época só daria para comprar uma casa simples na cidade, e a sobra parecia insuficiente para iniciar uma nova atividade.

Finalmente, chegou a hora da mudança, indo morar de aluguel no povoado a 20 quilômetros dali, a fim de prover os primeiros estudos para os cinco filhos já ficando barbados. A mudança alterou totalmente os hábitos da famíli, que era bastante unida e adaptada à vida simples do campo. Com os filhos estudando na vila, seu Olívio se esforçava mais para retirar o sustento da família, entre a lida árdua na fazenda e as frequentes idas ao povoado. Os anos foram se passando, até que vila onde moravam foi emancipada, advindo dali, as primeiras articulações de escolhas de candidatos à prefeitura municipal. Seu Olívio, que nunca havia se envolvido com política, foi sondado para concorrer ao cargo majoritário na primeira eleição.

Inicialmente, ele tentou justificar que não pretendia ser candidato. Seu compromisso era estritamente à família e à educação dos filhos. Além de não dispor de recursos, teria que enfrentar o Dr. Bartolomeu de Andrade, advogado, rico fazendeiro, o que seria quase um suicídio político. Agradeceu aos companheiros, empenhando a palavra com a promessa de ajudar outro candidato da vontade daquele grupo.

Uma semana depois, numa outra reunião, foi de novo interpelado pelo senhor Bonifácio:

__Então, seu Olívio, o senhor já tem uma nova posição?

__Não senhor, a minha decisão continua inalterada.

Foi aí, que outro líder pediu a palavra, assim dizendo:

__Talvez o senhor não saiba que numa pesquisa realizada há alguns dias, o seu nome apareceu em primeiro lugar, por isso, a vontade popular deve sobrepor a todas as vontades pessoais e ser maior que os demais compromissos de qualquer cidadão. Desta forma, o senhor não poderá fugir desta convocação que é também um dever patriótico. Hoje, com a sua popularidade, espírito de luta e de brasilidade, não poderá frustrar esse povo, nem as novas gerações.

Sebastião Alves, falou com tamanha eloquência que foi capaz de tocar o coração do companheiro indeciso. Foi aí que seu Olívio bradou forte e em bom som:

__Bem, senhores, pressinto que o nosso destino a partir de agora começa a ganhar novos rumos. Os senhores me convenceram. Aceito o desafio, mas preciso de carta branca para indicar o nome do seu Sebastião Alves, para compor a minha chapa como candidato a vice-prefeito, mapear as prioridades, tocar a campanha, ganhar as eleições e administrar o município, pois não assumo compromisso pela metade. Tudo que proponho a fazer, o faço com zelo e responsabilidade.

Naquele instante, foi amplamente ovacionado.

As campanhas, como sempre acontecem, vieram acirradas, com discursos inflamados. O outro candidato poderoso que contava com o apoio de deputados, não admitia perder para um adversário qualquer, da estirpe do seu Olívio.

Seu Olívio, dono de uma simplicidade única, não se intimidava. Seguia firme, ignorando calúnias e pressões, tendo como slogan de campanha: Honestidade, educação, saúde, luz, água, estradas...

Às vésperas da eleição, no último comício na praça da pequena cidade, os correligionários de seu Olívio tiveram que expulsar da multidão três rapazes que estavam fazendo provocações.

Finalmente, chegou o dia da eleição que transcorreu dentro da ordem, salvo pequenos incidentes entre cabos-eleitorais dos dois candidatos.

Concluída a apuração dos votos, seu Olívio foi eleito com uma votação que surpreendeu até seus companheiros.

Empossado, uma das primeiras decisões do prefeito foi contratar os primeiros funcionários para movimentar a máquina administrativa. Um fato que chamou logo a atenção, foi o exemplo de ética, de moralidade ao não contratar nenhum de seus parentes.

Indagado, foi enfático e assim respondeu:

__Não cheguei à prefeitura para me servir dela, mas para servir a esse povo com o meu trabalho, através de obras de alcance social e coletivo. Para executar esse trabalho, recebo os meus subsídios de prefeito eleito, garantindo o meu sustento e da minha família. E acrescentou: _ dentro de poucos meses, haverá concurso para preenchimento de todos os cargos na prefeitura. Aí sim, se algum parente for aprovado, será admitido pelo critério de competência no serviço público, uma vez que esta contratação é temporária e não dará garantia permanente no emprego.

Com essa obstinação, seu Olívio chegou ao final do mandato, como um dos melhores prefeitos de seu Estado, pelo excelente desempenho que imprimiu nas políticas de coordenação, planejamento e execução. É claro que na administração pública as dificuldades são imensas, mas contou com uma equipe interessada, coesa, que esteve em plena sintonia com suas ideias, executando as tarefas com competência, fazendo um governo profícuo, de realizações.

Granjeou a confiança do Governador e dos companheiros de partido. Entregou à população: quatro escolas municipais e quatro estaduais, da 1ª à 4ª séries do ensino primário, sendo quatro na área urbana e quatro na área rural. Entregou ainda, uma escola estadual de 1º e 2° graus, na área urbana; contratou professores, melhorou seus vencimentos, construiu um hospital e um posto de saúde, entregando-os ao público em pleno funcionamento; comprou duas ambulâncias novas; contratou médicos, dentistas e pessoal de apoio; implantou e instalou rede de energia elétrica na cidade, que antes padecia no escuro; construiu a sede da prefeitura; construiu o prédio para instalar a polícia militar e outro para a polícia civil; implantou e instalou rede de captação de água potável e rede de esgotos; construiu uma usina de tratamento de lixo; comprou um caminhão para fazer coleta de lixo; comprou veículos e maquinários para executar obras; recuperou e construiu várias estradas e pontes em todo o município; construiu o mercado municipal; calçou e asfaltou quase todas as ruas; plantou árvores, construiu praças e jardins; influiu sistematicamente no processo para ligar por asfalto a sede do município com a capital do Estado; entregou para o município uma agência bancária e outra dos correios e telégrafos; estimulou a instalação de cooperativas agrícolas; estimulou a instalação de duas fábricas: uma de calçados, outra de chapéus, gerando mais de 380 empregos diretos; enfim, entregou para seu sucessor, o município totalmente transformado, sendo o mais importante ter conseguido captar e aplicar bem os recursos vindos do município, do estado e da união, sem deixar a prefeitura endividada. Construiu muitas outras obras de destaque.. Deixou a sua marca, fez história, saindo aclamado pelo povo.

Ao deixar a prefeitura, foi nomeado pelo governador de seu Estado para ocupar uma Secretaria Estadual, passando a residir na capital, abrindo um leque de oportunidades para os habitantes do lugar.

Um feito quase inédito, como o do seu Olívio só acontece em raras gerações e não acontece por acaso. Seu Olívio foi realmente um gestor público que fez a diferença: foi imprevisível, despojado de vaidade pessoal, honesto, inteligente, batalhador, enfim, um predestinado.

Onofre Ferreira do Prado
Enviado por Onofre Ferreira do Prado em 21/02/2010
Reeditado em 09/08/2022
Código do texto: T2100149
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