Lua de Sangue

Descobri depois de alguns anos: não há vantagem em fumar. Nós não precisamos do cigarro para absolutamente nada, é um prazer momentâneo que peca pelo seu custo beneficio, ainda que fossem os milhares de reais que nos toma e não nossa vida.

Há alguns anos comprei um quadro no qual um homem observava, solitário, sentado num banco de praça, a lua. Aquele quadro ficou no meu quarto por anos, ainda está lá e desde então soube que de alguma forma aquilo mudaria minha vida.

Eu fumava desde criança, isso não mudou quando eu formei em jornalismo, mas certo dia, transmitindo o jornal da noite, uma pesquisa na qual eu teria de passar me impressionou. Incomodou-me de certa forma, ela mostrava a insatisfação dos fumantes com o cigarro, os números dos que queriam parar eram altos assim como os que conseguiram.

Aquelas pessoas eram exemplos. Elas conseguiram parar, eu tentava, não conseguia. Os riscos à minha saúde eram eminentes, principalmente se eu não parasse dentro em breve.

Ainda naquela noite voltei a meu apartamento, meu reflexo no boxe era uma imagem distorcida, vi alguém desprezível, era a face da derrota e do cansaço, aquilo era realmente eu, não me imaginara daquela forma, eu vi ali só uma casca, um corpo estragado por uma única escolha errada.

Em fúria, quebrei o vidro com um soco, minha mão cortou e jorrou sangue, eu estava nervoso demais, fui ao quarto pus um cigarro na boca, estava preste a acendê-lo quando meus olhos encontraram a lua. Ainda com a mão pingando, larguei o cigarro, me aproximei do quadro e pintei a lua em toda sua solidão, com sangue.

Pude perceber de súbito que aquele homem sentado na praça, solitário, era eu, a lua imponente no céu era a imagem da minha vida. Um homem que só conseguiria companhia daquelas sombras e do que elas poderiam reservar, mesmo assim se sentiria solitário, porque aquilo não era ele de verdade.

O sangue repleto de melancolia na noite se eternizaria como penalidade e lembrança de que o belo e o esplêndido já fora uma verdade, antes do vermelho. O quadro martelava na minha memória como a minha vida não poderia ser. Nesse ponto eu parei de fumar, o quadro fora uma arte significativa, agora era uma obra simples, mas magnífica e sentimental, assim como a minha vida.

Leia meu único acróstico!! "Meu nome minha vida"

Lucas Dias
Enviado por Lucas Dias em 18/02/2010
Reeditado em 20/03/2011
Código do texto: T2093975