Portal para o Inferno
Onze horas da manhã, o calor infernal dá ensejo um cenário devastador, odores exalando impregnando todo ambiente, pessoas abarrotadas em um coletivo, quase um curral, pareciam alheios ao século XXI longe de todas noções básicas de limpeza, feições estranhas, cores alteradas pela sujeira, estranhas formas de vida que sobrevivem como larva alimentando-se de podridão.
Crianças se amamentado em seios que teimavam em ficar expostos, com suores descendo ao colo misturando-se com o seu aleitamento, já desde cedo aprendendo a conviver com a sujeira e criando anticorpos.
Havia algumas mulheres com cabelos esvoaçados, com alguns grampos, o colarinho da camisa escuro, a nuca com uma crosta já solidificada de grude, vestidas com roupas que marcavam seus corpos nada convencionais, shortes lycras amarelados no fundilho.
Homens suados com os braços segurados no corremão no ônibus, camisa regata, pelos sem serem aparados, catinguentos, gaiolas, passarinhos, sacolas de peixe ,alface, odores misturados, hálitos de carnificina.
Crianças com feridas expostas, correntes de bicheiro no pescoço, tatuagens esverdeadas, crianças mães de outras, talvez aquelas pessoas de cores encardidas, fossem albinas, brancas, amarelas, negras, a sujeira não permitia uma certeza de qual era a cor daquelas pessoas.
Quantos milhões de bactérias existiriam ali naqueles assentos, corrimão, janelas, quantas mazelas estariam impregnadas no ar, cadeiras molhadas de suores, unhas dos pés grandes e pretas, pernas cinzentas, roupas com aparência de pano de chão,vozes ensurdecedoras, algazarras, palavreados, pessoas sucumbidas a miséria e a sujeira.
Talvez alguns poderiam pensar que alguns dos seres humanos não sofreram o processo de seleção natural, ou que era algum bicho imundo quadrúpede que aprenderam a andar com as próprias patas, virando bípedes e vivendo como se seres humanos fossem, ocupando a classe marginalizada, vivendo a par da sociedade, alheios ao século em que vivem,criando repulsa a sociedade.
A minha natureza não me permite sentir outras sensações além de nojo, desprezo e repulsa, não posso mudar a natureza das coisas, plantas não nascem no mar, e peixes não crescem em árvores, cada um enxerga o horizonte até onde sua janela permite, uns de frente para o mar, outros de frente para o morro.
Dedicado ao Coletivo Benedito Bentes, mercado, feitosa.