Gente simples
Saí de casa com a fina intenção de fotografar uns mandacarus. Apenas raiou o dia e lá estava eu numa estradinha erma e olhos atentos ao mato. Adentrei numa porteira, melhor, subi nos paus que protegiam a entrada da propriedade de Seu Pedro, um senhor da comunidade local. Bem, o certo é que me espantei quando ouvi o trote.
Um homem a cavalo vinha na estradinha. Se tinha se apercebido de mim não fez movimento que o denunciasse. Fumaça seu cigarrinho de palha entretido na fumaça que subia. Era cedo ainda e podia-se ver o orvalho no capim. Talvez pela terra meio molhada eu houvesse percebido o som das patas do animal. O capim produzia um som de rio correndo barrento depois da enxurrada.
O cavalo vinha num trote bom. Fiquei parada a observar com meu celular na mão. Minha arma de fotografia. Notei que o sertanejo puxou as rédeas do animal e fê-lo parar a alguns metros de mim.
_Bom dia, Dona!_ Ergueu um poço a aba do boné, desses de propagandas.
_Bom dia, Senhor!
_A senhora anda batendo foto de fror? Tem muita só quando chove...
Seus olhos, de um acentuado tom castanho, tinham um sorriso largo e brincalhão. Pensava com seus botões de para que a serventia de fotos de flores. Apenas lhe expliquei que minha intenção primeira eram os mandacarus; ao passo que ele lembrou-me de elas só abrirem as pétalas brancas à noite.
E senti-me nua de saberes diante daquele homem. Via-se em sua postura, toco de cigarro na ponta dos dedos, que ele era dono do saber da região. O corpo franzino já devia ter percorrido a pé ou no lombo dum cavalo cada vereda por dentro daquele mato. Pois sim, eu trocaria com ele umas palavras e descobriria como tirar fotos de uma flor de mandacaru.
Indagou se eu não seria irmã do Cerqueira, ex-enfermeiro de ofício lá da cidade. Com minha afirmação ele se derramou em explicações de como meu irmão uma vez tirara um anzol da perna de um dos meninos dele. E meus mandacarus esquecidos. Ouvi. Então, após um silêncio em que notei ter ele terminado sua história, fiz carinha de quem quer algo.
Ah, fui convidada a passar uma noite na casa dele e ainda teria um jantar de galinha caipira com pequi! Seu menino mais velho, de nome João Manoel, iria comigo pastorear um mandacaru soltar a flor na calada da noite.
Aceitei é claro! E meu coração acelerou os batimentos que tive medo do vaqueiro notar. Era um homem simples... que sempre sabem ser gente!
Voltei para casa só com a foto dele eu seu cavalo e também de umas flores do sertão. Brancas. Minha alma tais elas estava em Paz!... Lembro de ainda ter jogado um beijo a Seu Lourenço. Ele tinha ficado lá na entrada da porteira olhando-me sair na moto.