A experiência de fazer alguém feliz

Era final da década de 60, estávamos em uma fase muito difícil de nossas vidas porque havíamos perdido nossa mãe. Nosso pai não tardou a casar-se, éramos duas adolescentes e um menino. Meu irmão era o caçula, não tinha entendimento da situação, portanto sofria menos. Nosso pai trabalhava tempo integral, era médico de uma empresa de automóveis no ABC, ficávamos solitários.

Tínhamos uma empregada, a considerávamos um membro da família. Ela dava a atenção que nos faltava de nossa mãe, sentava-se a mesa para nos acompanhar quando a nossa madrasta se ausentava. Conhecia nosso apetite, os temperos e pratos preferidos, o gosto peculiar de cada um.

Maria espanhola era seu apelido. Robusta, cabelos negros, olhos da cor do mar. Ela nos estimava, tínhamos certeza. Possuía algum segredo, nunca comentava algo de sua vida. Sorria timidamente quando questionávamos algo.

Em 1969 a nossa Maria espanhola surpreendeu a todos. Adentrou em nossa casa com uma menina de onze anos. A garota era tímida, um olhar triste, permanecia estática em um banquinho observando a sua mãe trabalhar. Soubemos nesta época que a nossa Maria tinha três filhos, ficavam aos cuidados de sua comadre ha 50 quilômetros de distancia, porque necessitava trabalhar e não havia quem pudesse cuidar deles em sua casa. Ela os via somente nas folgas quinzenais.

O natal estava próximo, Maria preparava pratos deliciosos nesta época, especialmente uns biscoitinhos de polvilho com formas de bichinhos. Que delicia.

No natal daquele ano o presente maior não foram os brinquedos que recebemos, mas a presença daquela garotinha. Ela não participou da cerimônia, mas não nos esquecemos dela.

O jantar de natal encerrou, recebemos os nossos presentes e fomos correndo ao quartinho dos fundos onde a filha de Maria espanhola estava. Ela estava dormindo, acordamos a menina. Surpresa, ela abriu os olhinhos sonolenta. Então entregamos a ela uma boneca de uma marca de brinquedos famosa `Estr..’ embalada em um lindo papel, com laço.

Falamos a ela que o Papai Noel pediu para entregar aquele pacote a ela. A menina começou a chorar, ficamos assustados, então fizemos a seguinte pergunta:

- Por que esta chorando?

E ela respondeu:

- O papai Noel nunca se lembrou de mim!

Foi uma das cenas mais surpreendentes que presenciamos em toda vida. A menina pegou o pacote, desfez com delicadeza o embrulho, seus olhinhos brilharam ao ver a boneca enviada pelo papai Noel. Imediatamente parou de chorar, abraçou o presente como se fosse um bebe verdadeiro.

Saímos do quarto, certamente aquela menina deve ter vislumbrado o paraíso naquela noite, é possível que tenha sonhado com o papai Noel, naquela noite a nossa Maria espanhola escutou a menina falar diversas vezes (dormindo):

- Papai Noel, papai Noel !

Isto aconteceu há décadas e a menina tornou-se uma cinquentona, ainda preserva aquela boneca.

Outro dia ofertei um brinquedo a uma criança, em dois dias estava quebrado.

Homenagem a

Lucia Van Dersen - Paula Van Dersen

Marina Gentile
Enviado por Marina Gentile em 02/02/2010
Reeditado em 16/02/2013
Código do texto: T2064231
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