Renascimentos
Renascimentos
Belvedere Bruno
Por onde andaria Henrique? - perguntava-se Marilda, em meio aos objetos deixados por ele quando de sua inesperada partida. Durante alguns meses, atribuíra a uma depressão sua mudança de comportamento. Quando ele colocou alguns dos seus pertences em uma mochila e saiu dizendo que iria desanuviar a mente, ela absorveu o fato como se ele precisasse de "um tempo". Não pensou que fosse algo definitivo, embora hoje o analisasse como puro ato de covardia.
O que mais a intrigava era ninguém saber seu paradeiro . Parecia que se desintegrara no cosmos - dizia- com um sorriso forçado. Por vezes, tinha que refrear o impulso de sair pelas ruas gritando o nome daquele homem. Como pudera se enganar com seu caráter, se viveram tantos anos juntos e, em nenhum momento, ele demostrara comportamento oscilante ? Sempre dizia que Henrique fora um oásis em sua vida.
Era duro encarar as pessoas, pois não tinha respostas para a insólita situação. Buscava encontrar no passado algum deslize, alguma palavra, algum sinal que permitisse, ao menos, fazer uma ideia, por mais louca que fosse, acerca da ocorrência. Pensava nos inúmeros casos que já havia lido , como homens que iam comprar cigarro em boteco de esquina e nunca mais voltavam. Como poderia imaginar que, um dia , faria parte dessas estatísticas?
O tempo parecia voar. Um ano, dois , três ...
Agora , passados exatamente cinco anos sem que nenhuma pista fosse encontrada, Marilda tentava encerrar o ciclo. O que ainda a incomodava não era mais o desaparecimento, mas o desgaste emocional que sofrera fazendo conjeturas.
Com uma taça de vinho nas mãos, ouvia Diana Krall quando, subitamente, o telefone tocou. Do outro lado, uma voz inesquecível, que sempre lhe provocara arrepios, parecia ainda exercer sobre ela grande fascínio. Rememorando deliciosos episódios da juventude, riram, fizeram confissões, e ela sentiu-se à vontade para dizer que, há tempos, não se divertia tanto , pois havia esquecido o significado da palavra alegria.
Suavemente, ele pediu a Marilda que tentasse retomar aquela vivacidade que tanto o encantara. As palavras tiveram um efeito mágico sobre ela. E só então, Henrique, de fato, passou a ser cinzas, enquanto o fogo de uma nova paixão tirava Marilda daquele angustiante estado de desviver.