NUNCA, NADA ESTAVA BOM
Com dificuldade, ela se movia.
Parecia que toda vez que se sentava era a primeira vez. Devagar, apoiava-se na mesa, o tempo da chegada das nádegas à cadeira demorava séculos. Gorda, barriguda, feia e fedida. Uma pessoa que me causava repugnância.
Lembro-me de como ela subia as escadas. Apoiando-se no corrimão. Dois pés no mesmo degrau por vez. Devagar, devagar e ofegante.
- Inferno! Sempre repetia esta palavra.
Achava-se sempre injustiçada, sempre o mundo conspirava contra ela. Achava-se imune às vicissitudes da vida. Uma doença era um enorme fardo, um resfriado era um inferno, o salário, era o pior.
Praguejava se fazia calor. Se fizesse frio as pragas rogadas seriam todas maiores e mais intensas.
Nunca, nada estava bom.
Falava de tempos passados como se estes fossem os bons tempos. Falava da vida como se esta fosse um fardo pesado.
Pesadamente arrastava-se, cada vez mais vagarosamente. Sentia uma preguiça enorme. E nada a impelia à nada.
Nunca, nada estava bom.
Num dia ensolarado ela faleceu. Lembro-me que fiquei feliz, pois ela precisava morrer. A vida já não convinha àquela carcaça móvel.
Às vezes é necessário morrer.