A Vírgula Mortal
José era um rapaz muito esperto. A natureza foi-lhe generosa, dando-lhe certos dons para compensar a deficiência com a qual conviveu desde o nascimento: José era mudo. Apesar disso, aprendeu a ler e a escrever muito cedo. Comunicava-se muito bem por meio de sinais, mas na maioria das vezes, escrevia em um papel pequenas frases que traduziam seus pedidos ou intenções.
Certo dia, sua tia Dora o convidou para passar uns dias em Fortaleza. Zé, como era chamado por todos, ficou maravilhado, e embarcou no dia seguinte. Ao chegar, foi recebido pela tia, que o hospedou confortavelmente. Zé havia adquirido o hábito de tomar um cafezinho diariamente na padaria mais próxima de sua casa, em Santos. No dia seguinte, perguntou à tia se havia algum local onde pudesse manter seu hábito matinal. Tia Dora ofereceu-lhe seus serviços, mas Zé adorava o cafezinho do boteco.
Indicado pela tia, o rapaz dirigiu-se ao bar do Maneco, mais ou menos a três quadras de distância. Dez minutos depois, lá estava o Zé sentado em um banquinho do bar. Como de costume, apanhou um papel no bolso e escreveu algumas palavras para efetuar o pedido. Alguns fregueses assistiram a uma cena inusitada, além de triste. Todos viram quando o Maneco, aquele cearense bruto e ignorante, pulou o balcão com uma peixeira em punho, e desferiu vários golpes no peito de José.
O rapaz esvaiu-se em sangue e dali não mais se levantou. Morreu! Um dos fregueses, aguçado pela curiosidade, retirou da mão cerrada do rapaz aquele pequeno papel, no qual observou a seguinte oração:
— Eu quero um café, fresco!
Pois é! A língua é cheia de surpresas. Uma simples vírgula a mais pode ser mortal...