A FEIRA
A luz do sol, surgida por trás das nuvens densas, encontrou o pátio da feira cheio de gente.
Era o dia da feira grande onde se encontrava de tudo, onde se vendia de tudo, onde se comprava de tudo...
- que batata mais feia é essa, seu Nelson?
- feia e cara!
- olhe patroa, juro pela fé de Cristo que era a melhor da Ceasa. (para a outra freguesa) não está cara não senhora, é o melhor preço da feira.
- quanto está o jerimum?
- jerimum, é dois real.
- eu quero feijão verde...
- estou debulhando. Quanto a senhora quer?
- meio quilo basta.
- o pessoal de casa desaprendeu de comer foi?
- ôxe! Meio quilo cresce como diabo depois que bota a farinha e a verdura.
- seu Nelson que pimentão pixototinho é esse? Parece mais pimenta de cheiro!
- ta pequeno, mas ta bom. Pode levar em confiança que vai durar a semana toda é do meu sítio, não tem veneno não.
- quanto o molho de coentro?
- cinquenta.
- o senhor agora ta vendendo mato prá rezar olhado é?
- não senhora
- esse molho de coentro está parecendo maço de folha de rezar. Só tem três talinho...
- eu tive que diminuir o molho para poder manter o preço. A chuva estragou a plantação toda. Ninguém tem coentro não.
- seu Nelson, que banana mais caxexa é essa? Parece mais bimba de macaco. (risos)
- era a melhor que tinha na Ceasa. Essa veio do assentamento de Goiana. A estrada de S. Vicente a cheia levou. Ninguém tem banana não.
- esse inhame cozinha, seu Nelson?
- cozinha até demais, olhe como está alvinho.
- o senhor tem cebola roxa?
- tenho um pouquinho que uma freguesa encomendou. Quer levar a metade? Olhe aqui como tá boa.
- o senhor bota metade desse repolho para mim?
- tem couve?
- cinquenta centavos o molho.
- eu queria batata doce.
- escolha ali no balaio.
- quanto a laranja, seu Nelson?
- cinco por um real. Manduca, bote a laranja da freguesa nessa bolsa. Quantas a senhora quer?
- bote cinquenta... não, bote vinte e cinco.
- seu Nelson, tem vagem?
- por que esse preço todo no tomate?
- eu comprei a caixa por trinta e cinco, depois de escolher, o que sobra não dá nem para empatar o dinheiro. Só trouxe por causa dos fregueses.
- eu quero maxixe e quiabo.
- Manduca, atende a essa menina aqui.
- e esse jerimum, seu Nelson, tá bom?
- se não tiver cuidado ele desmancha todo.
- bote um molho de coentro e cebolinha, que eu tô vexado.
- tem alho, seu Nelson?
- esse cabra é engraçado, não faz nada na vida e diz que tá vexado só para ser atendido na frente dos outros. Pode ver, quando vocês sair daqui, ele vai tá lá na esquina, fazendo nada.
- Galego, bote um quilo de farinha. Eu quero da quebradinha e sem goma.
- não tem trocado não?
- quanto está a charque?
- quer quantos quilos?
- preciso primeiro saber o preço.
- é ponta de agulha. De primeira prá feijão. Oito real o quilo.
- eu quero prá fazer arrumadinho, bote um quilo do lado com menos gordura.
- oxente! Charque gorda é que dá gosto no arrumadinho.
- mas o pessoal lá de casa é muito cheio de luxo. Se botar muito gorda ninguém come.
- melhor prá senhora que fica com tudo.
- que nada seu Galego, eu fico só com a raiva de preparar as coisas e ninguém comer. Ficam catando no prato feito galinha ciscando.
- seu Lula, mãe mandou ver um quilo de massa de mandioca e dois coco ralado.
- esse queijo assa?
- esse aqui que tem mais sal assa melhor. Esse daí derrete todo.
- tem manteiga de garrafa?
- tem, tá lá no carro. Eu vou buscar. (e saiu em desabalada carreira).
- quanto é o abacaxi, freguês?
- esse ovo de capoeira foi o que eu encomendei semana passada?
- é sim, mas só consegui seis. Ninguém quer vender mais não. O pessoal tá juntando prá deitar.
- mãe eu quero algodão doce...
- não senhor. Tá muito cedo prá comer essa porcaria. Inventa de não comer em casa prá tá pedindo tudo que vê pela rua.
- seu Zeca, trate essa cabeça de porco prá mim. Eu quero mocotó e tripa também.
- tem carne de sol de primeira. É chã de dentro. Vai levar?
- tire o joelho desse pernil aqui. Eu vou levar.
- Netinho atenda a esse freguês aqui. Tem torresmo, o senhor quer levar?
- quanto é esse galo?
- menina! Eu esqueci de comprar a goma prá fazer a tapioca que mãe mandou. Corre lá em seu Lula diz que eu pago semana que vem. Vou ficar te esperando aqui visse?
- seu João meus passarinhos vão ficar sem jiló é?
- não tinha nem um prá fazer remédio lá na Ceasa. Leve maxixe.
- maxixe baixa o fogo. Não presta não.
- eu quero outra foice. Essa que o senhor me vendeu não corta nem sabão. Não tem no mundo que bote fio nela.
- tem freio prá jumento de carroça. O freio de cavalo cortou a venta dele toda.
- Nequinho, leve a bicicleta prá encher o pneu.
- esse bolo barra branca é de Bezerros? Bote uma quarta e um pedaço dessa goiabada.
- bote dois caldo de cana. Quer pão doce ou bolo Zefinha?
- quer carro de mão prá levar as compra?
- essa fava é nova? Bote dois quilo.
- Lourdinha, você comprou carne de bode?
- Vixe Maria, ia esquecendo...
- ei moça, quer comprar esse rádio de pilha, tem nota fiscal...
- mas mãe, eu vi um celular que era a coisa mais linda...
- menino, tange essa cachorro do meio do povo...
- o senhor sabe dizer onde eu posso encontrar mel de abelhas?
- dona Antonia, por favor prepare o tempero lá de casa.
- é semente de coentro, orégano, um pouquinho de pimenta do reino, louro, cuminho, alecrim... que mais?
- sei não senhora, mãe que mandou ver e disse que a senhora moesse tudo bem fininho...
- tem rapadura batida, dona Antonia?
- essa semana não veio não meu filho...
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Esse texto foi produzido sem levar em conta a forma culta da língua portuguesa. Procurei reproduzir o mais fiel possível, a maneira pernambucana de falar. Muitas vezes inculta, mas sem dúvida, melodiosa.