CHINELO DE DEDO
Assisti a missa do penúltimo sábado, na Igreja Matriz da Santíssima Trindade, sabendo que se comemorava na oportunidade o Dia do Padre. No altar, um padre popular, simples, humilde, de chinelo de dedo. Poderia ter sido uma missa tão normal quanto outra qualquer, porém, algumas palavras, ditas pelo padre Pereira no encerramento da cerimônia, foram, para mim, mensagens enviadas por um Deus que está presente na vida daqueles que sabem dividir a própria vida com os outros.
Toda a comunidade tieteense já está acostumada com o jeitão do padre Pereira. Onde quer que o encontremos, há sempre o sorriso largo de quem está agradecido por viver o sacerdócio. Chinelo de dedo nos pés, anda por todos os lugares. Até na missa que celebra, pois quem olha para seus pés sente a presença do Cristo humilde que não dá bolas para as riquezas da vida.
Quando o encontro na rua, há sempre o mesmo cumprimento alegre e feliz. Não sei se consegue lembrar do meu nome, pois são tantas as pessoas que ele cumprimenta e sorri, que acredito ser muito difícil guardar o nome de todo mundo. O que sinto, é que ele é tão meu amigo e irmão, quanto pode ser de qualquer outra pessoa. É o representante certo daquele Cristo que aprendemos a amar. O representante daquele Cristo em quem confiamos. Trocar uma prosa com ele é suficiente para despertar motivação.
Pois bem! Voltemos ao assunto da missa no dia do Padre. Lá no finalzinho, depois de ter feito um sermão bonito sobre a multiplicação dos pães, ele teve que agradecer um presente que recebeu da equipe da liturgia. Quem estava assistindo a missa, já imaginava que seria um par de chinelos de dedo. Não foi. Até ele, o padre, antes de abrir o presente, gozou a si próprio dizendo “espero que não seja um par de meias”. Sorrisos...
Com sua voz marcante, olhou para os fiéis, para todos os lados, agradeceu e disse que vida de padre é problema: se andar bem vestido, é patricinho; se andar de chinelo de dedo, é relaxado. Se andar só com mulher, é sem vergonha; se andar só com homem, é veado. E foi por aí afora, fazendo comparações entre o que fazer e o que não fazer... Deu um segundinho no seu agradecimento, buscou o que há de mais puro no fundo do seu coração, e disse: “nestes onze anos de sacerdócio, sempre agradeço a Deus. Assisto, todos os anos, ao completar mais um ano de vida sacerdotal, minha fita de ordenação e reflito se estou seguindo corretamente tudo o que o bispo ordenante, Dom Fré, me fez prometer diante de Deus”. Aí, já com a voz embargada, muito embora padre tem uma prática danada para disfarçar a emoção, Pereira finalizou: “se tivesse que começar tudo de novo, começaria com uma diferença: pediria a Deus para tornar minha vida sacerdotal mais difícil, pois está muito fácil ser padre...”
Eu, que já tive felicidade de ouvir mensagens extremamente marcantes, deixei meu queixo cair. Isso é multiplicar o pão...
(texto escrito em agosto de 2001)