SOB O RELÂMPAGO DE ETERNAS LUZES...

Joseph e Margarida se conheceram num final de tarde de domingo, quando o transatlântico cruzava as altas e agitadas águas internacionais, vindo da Itália.

Era meados de hum mil novecentos e quarenta e seis, finda a segunda grande guerra, as dificuldades se espalhavam pela Europa e as expectativas para se chegar ao novo mundo geravam a esperança de grandes dias, embora apenas mais tarde a história registraria todas as dificuldades pelas quais atravessaria aquele grande contingente de imigração europeia.

Naquela tarde os mares encrespavam sob uma forte tempestade,o céu enegrecido se iluminava à luz dos relâmpagos que se perdiam na imensidão do horizonte.

Margarida contava com dezenove anos, dois a menos que Joseph, e assustada, olhava para a tempestade pelo entremeio da janela da cabine, quando as luzes do navio se apagaram.

Incumbida pela avó de arranjar algumas velas com a tripulação, tropeçou no corredor da embarcação sobre os pés de Joseph, que também buscava pelas mesmas luzes.

E ali se acenderia uma forte amizade, rumo às luzes ofuscantes do mais forte dos sentimentos que ambos ainda desconheciam.

Passavam horas conversando sobre os amigos que deixaram no outro lado do mundo, e sobre o imprevisto futuro que lhes esperava em terras brasileiras.

Aqueles trinta dias foram a sua eternidade.

Ali juraram que seguiriam juntos pela vida, porque quando se é muito jovem, propositalmente,não nos é permitido conhecer a força das mãos do tempo.

Margarida viria para São Paulo, rumo à casa de sua tia no bairro do Butantã, e Joseph seguiria para o Brás, aonde já o esperava um amigo dos seus pais.

A princípio, a vinda de Joseph seria provisória e já se planejara seu breve retorno a Salerno, a sua cidade de origem.

Porém, os laços daquele encontro com Margarida pareciam mudar os planos de Joseph que acreditava poder desafiar o destino.

Tão logo chegaram ao Brasil, Joseph procurou a tia de Margarida para que lhe permitisse namorar a garota, porém não obteve sucesso, posto que a menina já estava prometida para um oficial do exército brasileiro, doze anos mais velho que ela.

Naquele tempo era assim- me contou a dona Margarida- " casamento era coisa arranjada e pronto, não se argumentava um pio!", "ainda mais para quem vinha de tão longe para uma terra desconhecida", "tinha que se amarrar o burro bem amarradinho, e rapidamente! , sob o risco "das garôtas se perderem para sempre".

E então, sob as pompas militares, um dia Margarida casou-se como o seu oficial graduado, por quem , com o tempo, nutriu uma grande amizade e forte admiração.

Dez anos depois Margarida estava viúva, com cinco filhos que criou sozinha e com grande esmero.

Nunca mais se casou e hoje desfruta duma bela família de netos e bisnetos no auge da plena felicidade dos seus oitenta e dois anos.

Foi asssim que ouvi a presente história de Joseph e Margarida, quando certo dia ela me disse que desde o seu casamento nunca mais soube de Joseph.

Então perguntei-lhe do amor, se havia experimentado a mesma emoção durante o casamento.

Olhou-me bem fundo nos meus olhos, puxou um suspiro e como sob um rellâmpago confessou-me com a face iluminada:

-Amor?... não minha querida, Frederico foi um grande amigo e companheiro, porém eu nunca mais encontrei "meu Joseph" em canto algum das minhas horas...

VERÍDICO.