Pé na Estrada (EC)

Férias marcadas, depois de quase três anos de muita ralação, sem parar. A esposa e os meninos nem acreditaram quando falei da viagem de duas semanas à Disney. A merreca economizada à custa de algum sacrifício ia dar contadinha para passagens, hospedagem, alimentação e alguns passeios por lá. Nada de comprar bugigangas, orelhinhas do Mickey ou camisetas temáticas. Adoecer, então, seria motivo de banimento familiar. Ainda assim, estávamos todos eufóricos quando fomos à agência fechar o pacote. Ainda pensamos em parcelar, mas corríamos o risco de perder a vantagem do dólar baixo.

Enfim, preenchi o cheque vultoso e fomos para casa, saltitantes, o contrato debaixo do braço.

Os quase dois meses seguintes foram de grande ansiedade e expectativa. Só se falava na viagem. De repente, todo mundo sabia tudo da Disney, todo mundo tinha um palpite ou uma dica para dar. Semanas antes, já tínhamos todos os roteiros traçados, tudo planejadinho, para aproveitarmos cada minuto. No dia do embarque, fomos para o aeroporto com quatro horas de antecedência, porque eu não conseguia mais gerenciar a impaciência dos meninos em casa. almoçaríamos lá mesmo, sanduíches e refrigerantes, para já entrarmos no clima dos States.

No balcão do check-in, a surpresa: não havia passagens em nossos nomes.

- Como assim? - perguntei, já sacando o contrato da mala.

Ao ver a logo do papel, a atendente mostrou-se sinceramente pesarosa.

- O senhor não viu ontem, na TV?

- Anh!? - foi só o que consegui pronunciar.

Ela explicou que a agência que contratamos quebrou. Várias pessoas foram lesadas. Na véspera, houve um tremendo quebra-quebra no aeroporto. Tinha dado em todos os jornais.

- O senhor não viu?

Eu olhava para ela e para os meninos, que pareciam haver entendido tudo muito melhor que eu.

- Não vamos mais ver a Minnie, pai? - perguntou Isabela, com a vozinha aflita.

Engoli em seco. Peguei sua mãozinha que me puxava pela calça, agradeci à moça uniformizada que ainda recomendou-me procurar um advogado, juntei a turma, a bagagem, a raiva, a vergonha e a humilhação e afastei-me do balcão. Ao sentar-me no carro, pensava comigo:

- Vou sim. Vou procurar uma advogado. Mas não agora. Agora, eu e minha família estamos de malas prontas, saindo de férias...

Passei na casa do meu irmão e peguei um violão, alguns jogos e a barraca emprestada. Tomei a Saída Sul, sem destino certo.

Foram as melhores férias da nossa vida.

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Este texto faz parte do Exercício Criativo - De Malas Prontas.

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