Sábia e Pouca Bóia.
Sabiá e Pouca Bóia
O inspetor Vieira viu o elemento, baixo e gordo andando pela calçada da ‘Beneficência’ e reconheceu o Sabiá. Ficou cuidando. Um rapaz aproximou-se de Sabiá e trocaram alguma coisa. O inspetor puxou a aba do chapéu para a frente dos olhos e encostou na parede do bonito ‘Templo do Redentor’ a cuidar o Sabiá atravessar a rua e perto de uma árvore da ‘Praça Tamandaré’ entregar alguma coisa a uma mulher e ligeiro sumir entre os canteiros. Vieira correu para a praça e foi encontrar o Sabiá no ‘ Abrigo dos Ônibus ‘, recostado no balcão, comendo um bauru e tomando cerveja preta. O inspetor continuou sua ronda e avistou recostado no prédio do ‘Correio’, magro e alto, o Pouca Bóia conversando com dois sujeitos os quais, logo, afastaram-se caminhando ligeiro. Pouca Bóia olhou para os lados e seguiu para a ‘Praça Xavier Ferreira’. Vieira o seguiu e ficou ao lado do monumento a ‘Silva Paes’ a espia-lo . Na calçada da ‘Prefeitura’, Pouca Bóia, encontrou com um homem a quem entregou alguma coisa e o tal homem saiu quase correndo. Vieira atravessou a rua e o abordou:
-- Que tu estás aprontando?...Fala Pouca Bóia.
-- Opa...Boa noite inspetor...Estou olhando as estrelas.
-- Toma cuidado...Tu podes ver o sol quadrado.
Passados dois dias, Vieira ia atravessando o ‘Mercado’ e encontrou, no ‘Rei do Mocotó ‘, Sabiá e Pouca Bóia sentados junto a uma mesa cheia de pratos e garrafas de vinho. A dupla com dinheiro para promover um banquete. Alguma coisa havia.
Domingo, pela manhã, estava o inspetor Vieira , atrapalhado o trafego com a viatura policial estragada bem embaixo do ‘Pórtico’ e viu a velha caminhonete, barulhenta, dirigida pelo Sabiá. Fez parar. Na cabina a dupla; Sabiá e Pouca Bóia e a carroceria cheia de sacos com esterco de gado. Pouca Bóia explicou:
-- Bosta...É bosta de vaca...Pra nossa horta...A gente plantemos couve.
Na delegacia o delegado Valdir, sua grande barriga e seu enorme nariz com os óculos na ponta, examinando o livro de ocorrências . O inspetor Vieira junto ao computador procurando a ficha de Sabiá. Desligou e comentou:
-- É droga...Maconha...To na pista certa.
O delegado Valdir olhou por cima dos óculos. Ele explicou:
-- Pouca Bóia e Sabiá...Tão envolvidos com drogas.
-- Ora não amola!...Sabiá e Pouca Bóia, espécie em extinção. Dois autênticos malandros papareia...São Pedro o padroeiro da cidade do Rio Grande os protege...Os dois são do tempo do cabaré da ‘Mangacha’, são do tempo do trem do meio dia para Pelotas. Este era o trem que iam os estudantes de direito, que estudavam em Pelotas. O Sabiá comprou uma pasta de couro e andava no trem a dizer que era estudante. O malandro arrumou uma namorada, filha de um fazendeiro da estaçãozinha do Capão Secco. Quando o dito cujo fazendeiro descobriu que o Sabiá não era estudante porra nenhuma, botou ele pra correr dando tiros de sal na bunda do pilantra... Vieira pela espada de Ogun tu tens que consultar teu pai de santo...Ora o Sabiá e Pouca Bóia metidos com drogas...
- Eu vi eles almoçando no mercado e domingo eles estavam carregando bosta de vaca para plantarem couves...
-- Opa!...Bosta?!...Plantar couves...Como dizia o ‘Barão de Itararé’; além dos aviões de carreira qualquer coisa no ar...
O inspetor Vieira colocou o chapéu e saiu.
O vento frio varrendo as ruas do Rio Grande. Alta madrugada o delegado Valdir, enrolado num grosso poncho, entrou na delegacia onde o aguardavam o arrogante inspetor Vieira, o magro Pouca Bóia e o gordo Sábia que saudou o delegado.
-- Excelência... A gente quis esperar o dia clarear...
Vieira interrompeu:
-- Os pilantras estavam querendo fugir do flagrante.
O delegado Valdir levantou as mãos e mandou todo o mundo ficar calado. Pegou um dos cigarros que estavam sobre a mesa, olhou, cheirou e desmanchou:
-- Que merda é isto ?!
Pouca Bóia, sorriu, respondeu:
-- A própria seu delegado...Merda de vaca misturada com fumo...
O inspetor Vieira interrompeu:
-- Peguei os dois vendendo maconha no ‘Canalete’...
Sabiá interrompeu:
-- Maconha não...Mercadorias permitidas...Bosta de vaca e fumo.
O delegado desmanchou outro cigarro, olhou, cheirou e botou fogo. Perguntou:
-- Os bobalhões compravam ? Fumavam?
Sabiá contou:
-- Fumavam...Depois de três tragadas já ficavam enrolando a língua...Numa boa !
O delegado Valdir apontou para os dois e ordenou:
-- Amanhã , bem cedo, peguem a primeira lancha, e passem um bom tempo lá no ‘NORTE’.
FIM
(Zésouza- Rio Grande 1996)