Festa do porco
Na casa de Dona Moça havia sempre um porco engordando no chiqueiro do quintal; o dia da matança era uma festa! O encarregado da matança era Seu Nogueira, que fumava cachimbo e usava chapéu da polícia montada canadense. Era o terror das crianças, pois, corria uma lenda de que ele capava crianças rebeldes. Nos tempos D. Dona Moça, uma criança era rebelde, quando não atendia a um primeiro chamado para almoçar, tomar banho etc. Voltando ao porco: Era a verdadeira festa do porco...Tirava-se a gordura, que enchia latas de vinte quilos e dava para cozinhar até à próxima matança; as tripas eram usadas para fazer lingüiça bem temperada e chouriço; a carne que restava era distribuída pela vizinhança. Quando qualquer um matava porco pelas vizinhanças, o procedimento era sempre o mesmo. A família era devidamente avisada porque a comilança era grande, principalmente a família do Dado, filho de Dona Moça, que vivia sempre a perigo, comendo pouca carne no dia-a-dia. A citada senhora, também, gostava de criar patos, que passeavam pelo quintal naquele passo rebolativo; qualquer pessoa que chegasse fora do horário do almoço, ela imediatamente, pegava um pato ou uma galinha e fazia uma excelente comida, pontificando galinha ao molho pardo. Ninguém saia de lá sem almoço e ela se orgulhava disso; eram muito pobres; o marido Jacinto era guarda-cancela; ganhava pouco, e nos dias de folga comprava e vendia vidros usados; os vidros eram comprados, lavados e revendidos às firmas respectivas, pois, não se desperdiçavam embalagens, num período em que não as havia de plástico. Durante anos, ainda tiveram de sustentar uma filha com os quatro netos. A filha Coló era um tanto neurótica, e pretendia transformar os filhos em pessoas importantes...Todos medianamente inteligentes, mas de índole discutível; na idade adulta sobreviveram... Deixaram a Companhia de D. Moça,anos depois, graças aos esforços de parentes, que arranjaram emprego para os mais velhos. Seu Jacinto, segundo os comentários, fora doido varrido, tendo sido internado em hospício, o que desestabilizou financeiramente à família. Os dois filhos mais velhos de D. Moça passaram a ser arrimo da família, na época da doença desmiolada do pai. De fato, o comportamento do Seu Jacinto era um tanto inusitado, mas tinha sempre uma palavra de carinho para as filhas. Ele jamais conversava com alguém; difícil conversar com a mulher ou com os netos. Quando as coisas ficavam ruins, tomava porres homéricos, ocasião, em que ficava pelado, vestido apenas com a funda, que segurava sua hérnia gigantesca; evidentemente, os biógrafos omitiriam esse fato. Desconfio que ele tinha um bom coração!