A velhice e coração jovem

Velho, adjetivo, que tem muitos anos de vida, antigo, deteriorado, obsoleto, antiquado, ancião.

Ela lembrou, porque as mulheres jamais esquecem uma ofensa, tinha apenas 35 anos e aparência de 25 anos, e sempre foi vaidosa. Vaidosa sim, porque não. Ela sabia muito bem o que fica nas entrelinhas e ele começou a chamá-la de velha. E isso acontecia com relativa freqüência. Se estavam no meio dos amigos dele, ou das amigas dela, o que era pior, lá vinha ele em tom de brincadeira, e dizia você está ficando velha. Ela sempre teve a convicção que raramente a mulher não é tão ingênua e pura. Sabia por experiência que é mais fácil achar uma agulha no palheiro que uma amiga realmente sincera. Dessas ela teve a sorte de encontrar duas no decorrer da vida. Com essas ela pode contar, mas com as outras mulheres que, quando estavam em sua companhia, ele costumava fazer as brincadeiras de mau gosto, ah.. com essas não. Nessas ela não confiava. E ela foi ficando desapontada, seu coração ficou ressentido. Pois bem, passado algum tempo ela deu a entender que ele estava se tornando grosseiro, um autêntico ferrabrás.

E agora, depois de tantos anos, ele voltou a chamá-la de velha com todas as letras e ainda repetiu, você está velha mesmo. E ela teve uma surpresa, isto já não a incomodava mais. Ela ficou pensando, porque será que certas pessoas falam antes e pensam depois e não consegue entender como uma mulher tão diferente dele ainda continuou a seu lado. Repensou a vida e chegou a uma conclusão, isto foi um erro de percurso pois deveria ter se casado com um homem de outra profissão. Hoje ela sabe que não foi o homem errado que ela escolheu, foi a profissão errada. Ele deveria ser um ólogo e a cada dia se convence mais que um ólogo ela seria muito feliz. Poderia ser geólogo, musicólogo, arqueólogo. Imagina casada com um homem de uma dessas profissões, seria vista como uma jóia valiosíssima. Cada ruguinha que ela encontrar, cada marca do tempo, causaria euforia e ele diria, vinte anos depois, você está cada dia mais linda! E ele lhe diria 30 anos depois, que maravilha, quanto mais o tempo passa mais interessante ficas, aliás, não é o tempo que passa, quem passa somos nós. E quanto mais envelhecesse mais admirado ele ficaria. Mas ela se casou com um homem das exatas. Se ela se enrola nos saltos, ele já pergunta, não sabe mais andar, usa sapatos baixos e para de andar de saltão. Se ela pára para olhar algo, seja lá o que for, ele sai na frente e depois pergunta, está doendo alguma coisa? Se ela sobe ou desce as escadas, ela trata de se aprumar, caso contrário, lá vem a pergunta, não consegue mais andar direito? Ah! Se ele fosse um ólogo, ela suspira. Seria tão diferente! Quiçá sonhando ser um dia uma peça de museu. Mas aí ela acorda, sobe nos saltos e a vida segue, mas tem dias em que ela, com cólera, olha para ele e pensa, vetusto, adjetivo, muito velho, antiqüíssimo. Ele tem o espírito velho e ela tem o espírito jovem e é resiliente. A resiliência tem vários fatores, entre eles, o otimismo, a crença de que as coisas podem mudar para melhor, há um investimento contínuo de esperança, e porisso mesmo a convicção da capacidade de controlar o destino da vida, mesmo quando o poder de decisão esteja fora das mãos (psicologia).

Ela acredita no poder do amor maior e é uma pessoa que se encanta, ama as plantas, os animais, a natureza e crê que um dia tudo será diferente. O ser humano será mais sensível. Ah! Onde será que anda escondida a educação, o amor e os valores familiares. O homem já foi tão longe que agora só resta retroceder para melhorar.

Eu não me envergonho de corrigir os meus erros e mudar as minhas opiniões, porque não me envergonho de raciocinar e aprender (Alexandre Herculano).

Nadia Foes
Enviado por Nadia Foes em 09/09/2009
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