Minha avó.

Futuro!Quem não gostaria de conhecê-lo?Desde criança temos essa curiosidade, mesmo quando chegamos a certa altura da vida , que temos muito mais passado do que possibilidade de futuro, ainda nos indagamos, o que acontecerá comigo daqui há um ano?Daqui dez anos?

Minha mãe conta que minha avó tinha quarenta e três anos quando nasceu meu irmão, primeiro neto!Naquela ocasião ela tinha algumas enfermidades que a debilitavam e então ela prognosticou:

Que pena! não vou ver esta criança crescer.

E viveu até presenciar o vigésimo primeiro aniversário do filho de meu irmão, seu bisneto!

Minha avó faleceu com noventa e três anos.Era uma mulher fantástica!Ficou viúva quando tinha 32 anos , com quatro filhos para criar , o mais velho tinha doze anos.

A espanholita não tinha medo de nada! Enfrentava desde bandidos até bichos peçonhentos.

Na chácara onde ela morava e criou os filhos, plantava de tudo, de alface até berinjela, de jabuticaba a morango.

Sempre se sustentou e sustentou os filhos com o que plantava e colhia.

Não pensem que esta chácara ficava no interior,ficava em pleno coração da cidade de São Paulo, zona norte, Casa Verde.

Ela plantava também muitas flores e quando chegava o dia de finados, é quando ela mais faturava!

A chácara parecia um grande jardim, com margaridas, rosas,jasmins ,lírios, cravos,bocas -de -leões, minigirassóis, enfim, só flores de classe, não tinha crisântemo e monsenhor que são as flores dos finados atualmente.

É lógico que os filhos com doze anos já começavam a trabalhar para ajudar no sustento, nem que fosse para comprar um par de sapatos e uma roupinha, pois ela ainda tinha que pagar o aluguel da chácara .

Minha avó era a alegria em pessoa, sempre bem arrumada, adorava um baile, o que não era de estranhar, pois ela e as irmãs haviam sido bailarinas de flamenco quando viviam na Espanha.

Como ninguém é perfeito, ela tinha um gênio forte e ai de quem mexesse com a família dela.

Um episódio marcou essa proteção que ela dava aos filhos e netos:

Foi um dia em que a diretora da escola onde eu estudava reprendeu-me e me deu um tabefe na cabeça.Não era nada que eu tivesse feito, foi um equivoco.As meninas estavam enfileiradas no pátio para cantar o hino nacional, e justamente na hora da diretora passar ,uma amiga empurrou a outra, fazendo aquele efeito dominó na fila.No exato momento que eu fui empurrada e virei para trás para pedir a amiguinha de trás que parasse com a brincadeira, a diretora passou e bateu na que estava mais perto, no caso, eu.

Naquele tempo se aceitava que os professores batessem nos alunos.Os pais ainda davam bronca em quem apanhasse, pois alguma deveria ter aprontado!

Minha avó não se conformou.Ficou indignada! Logo com a neta dela?E ela que colhia as flores mais bonitas da chácara e levava para diretora para enfeitar a diretoria? Isso não ia ficar assim!

Foi lá no quintal, colheu as flores mais bonitas que havia e rumou em direção ao colégio.

Passou pela recepção e como todos já a conheciam, foi direto para sala da diretora e falou num bom portunhol:

”Senhora diretora, aqueja menina em quem a senhora deu um tapa hoy, es my nieta .A senhora primeiro tem que parir um fijo para depois querer bater.Estas son las últimas flores que lhe traigo.Hasta la vista!"

Saiu e nunca mais pisou naquela escola.E a diretoria nunca mais teve um lindo vaso de flores.E eu senti um orgulho danado da minha avó, que nem ler e escrever sabia, mas sabia enfrentar a diretora de igual para igual,para defender sua neta.

Quando ela chegou em casa me olhou e disse:

-El valiente vive hasta que el cobarde quiere.....(O valente vive quanto tempo o covarde deixar)

Não era guerreira a minha avo?