A musa

Como era linda aquela moça que todos os dias coloria suas manhãs. Tinha cabelos da cor de brasas ardentes escorrendo pelos ombros, os olhos tão verdes quanto as folhas da amendoeira recostada na janela, o rosto claro pontilhado de poucas, mas charmosas sardas.

Ela não falava, cantava numa voz tão doce que arrebatava seus sentidos e por mais que tentasse entender suas palavras, aquela boca pequena e vermelha o distraía com seus movimentos comedidos e sussurrantes.

Seu nome era único. As outras, por alguma inveja maternal foram agraciadas na certidão, mas somente ela personificava o próprio nome: Luana. Era uma delícia pronunciar aqueles fonemas, começava com um beijo e terminava com um suspiro.

Quando se aproximava dele, seu coração ficava mais acelerado, as mãos suavam frio e aquele perfume o deixava maravilhado. Nunca soube qual era, também não tinha coragem de perguntar. Se soubesse, colocaria em seu travesseiro só para sonhar com ela.

Os caras, seus amigos, achavam espetaculares umas mulheres de cinema, novela e outras que viviam em capas de revistas, mas para ele, nenhuma se comparava à Luana, não só por sua beleza e graça como também por ela ser real e acessível.

Certo dia, Luana veio com um vestido de flores, suave como uma brisa, os cabelos flamejantes contidos por duas presilhas azuis e um sol de entusiasmo no rosto. Movia-se como uma ninfa cantando num jardim mágico. Ele se perguntava, como o mundo poderia ser tão ruim se havia uma criatura tão intensamente bela como Luana. Sempre que a via, todas as preocupações acabavam.

Foi nesse mesmo dia que ele tirou discretamente uma foto dela com o celular. Olhou ao redor, esperou pelo melhor ângulo e disparou. Pegou um sorriso e olhos fechados, uma pena, mas ficou lindo. Depois colocaria até como papel de parede no seu computador.

Numa manhã de segunda-feira ele tomou o maior susto de sua vida, pois Luana não apareceu. Estava doente. Foram os dias mais angustiantes de sua vida. No lugar dela havia uma velha pálida que lembrava um quadro desbotado que havia na casa de seu avô. Também foi o período que ele mais mandou email para Luana, na maioria perguntando quando estaria de volta. Poucos foram respondidos.

Cerca de duas sofridas semanas depois ela entrou radiante pela porta com um vestido verde claro e sandálias brancas. Ele se segurou para não correr e abraçá-la na frente dos outros.Estava com tantas saudades.

Luana começou sua melodia diária e ele ficou embevecido, a cabeça apoiada nas mãos, sonhando com possibilidades. Então ela parou, lançou-lhe um olhar divertido e perguntou:

-Você está bem, Carlinhos?

-Sim, sim, estou...é que eu só tava pensando.- respondeu ele assustado sob vários olhares curiosos.

-Sei. Mas se você ficar pensando muito e não copiar a explicação vai ter problemas depois na prova.

-Desculpe, professora, eu vou copiar.

-Muito bem. Então, continuando, crianças.

Carlos tinha apenas doze anos, mas um amor com um fascínio diário o qual poucos adultos conseguiam manter.

Renan Moraes
Enviado por Renan Moraes em 26/08/2009
Reeditado em 26/08/2009
Código do texto: T1775595
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