A velha casa outra vez
Dedicado à memória de meu pai Elyzeu e à minha família
Queria retornar no tempo, voltar para aquela casa onde habito em pensamento. Somente passar um tempo nela e apagar os medos, expulsando todos os fantasmas que até hoje me perturbam o pensar.
Então, eu andaria por toda a casa e esperaria a noite chegar. Fecharia as portas dos fundos que davam para o quartinho, não teria medo, pois elas só se abririam ao meu toque e ninguém passaria por lá.
Fecharia depois a janela do meu quarto, mas antes olharia para o limoeiro como que o desafiando... Ninguém subiria por ali também, nem invadiria a minha horta.
E iria para sala de estar, com aquele vidro que nunca fechava direito, e ninguém se incomodava, estava sempre aberto.
Acho que eu tinha medo daquela casa.
Acho que eu ainda moro lá, apesar de todos estes anos passados.
Mas eu queria voltar lá e entrar mais uma vez em seus cômodos, rever o quintal de minha infância e apaziguar todas as memórias e descansar... descansar... O que passou somente ao tempo pertence.
Eu fui feliz naquela casa, tive momentos de pura felicidade dos quais nunca me esquecerei.
Naquela casa todos estavam presentes, coisa que hoje não é mais possível. Lá, tivemos muitos Natais e Anos Novos e sempre havia um aniversário a se comemorar.
Havia alegria e muita ingenuidade. A vida se mostrava tão simples que nós ali acreditávamos nisso. Na simplicidade do mundo.
Só que o tempo foi passando. Novas pessoas chegaram e compartilharam suas vidas com as nossas. Um novo tempo, uma nova era... e foi aí que tudo começou a mudar.
Já não tínhamos mais esta casa. Vivíamos em um outro local, outro planeta. Só que ainda estávamos juntos e isso era o mais importante.
Dois anos se passaram e uma nova mudança se fez presente. E nesse novo local vivemos por quinze anos, até começarmos a nos separar.
Queria voltar para estes tempos e viver tudo de novo. Enfrentar todas as dificuldades que vivemos neste período, só que todos juntos.
Queria ouvir a sua risada que me dava tanto conforto e segurança, como se nada no mundo pudesse me ferir naquela hora, como se eu fosse impenetrável, como se eu mandasse no mundo.
E veríamos nossos filmes juntos, mesmo que você dormisse no meio - já estou tão acostumado a isso - e não quisesse se levantar do sofá. Dividir você com meus irmãos e não ter ciúmes. Ser apenas bom. Ser apenas eu. Ser apenas você.
Mas a vida acabou para você e nós ficamos aqui. Eu não tenho a sua força, nunca terei. Então fico perdido achando que não construí nada, não fiz nada e não sou nada.
E uma fé me move e leva-me adiante. E mesmo sem nada saber, acabo fazendo. Se é certo ou errado, não sei. Um dia vou saber. Enquanto isso me sobram apenas as memórias e tudo aquilo que eu sempre quis fazer e não fiz. E nem sei porque não fiz. Não sei... Estou sozinho e sempre disse que era assim que eu queria que fosse. Mas me dá um certo medo ficar envelhecendo sem ter ninguém ao lado, sem ter alguém a quem me dedicar. Alguém que precise de mim, como eu, agora, preciso de você.
Sabe aquele abraço forte de feliz Ano Novo? É disso que eu precisava agora. E também da sua voz consolando, do orgulho que eu sempre soube que você tinha de mim.
Tudo o que eu não preciso agora é da minha indiferença, de não mostrar o que eu realmente sentia.
É tão tarde agora.
E me resta tão pouco tempo.
Eu não sei dizer nada por dizer...
Eu me calo.
Onde está você agora?
Eu estou aqui... Chorando...
E com muitas saudades!
Texto publicado no livro Muito Mais, de Márcio Martelli, Editora In House (2007).
Dedicado à memória de meu pai Elyzeu e à minha família
Queria retornar no tempo, voltar para aquela casa onde habito em pensamento. Somente passar um tempo nela e apagar os medos, expulsando todos os fantasmas que até hoje me perturbam o pensar.
Então, eu andaria por toda a casa e esperaria a noite chegar. Fecharia as portas dos fundos que davam para o quartinho, não teria medo, pois elas só se abririam ao meu toque e ninguém passaria por lá.
Fecharia depois a janela do meu quarto, mas antes olharia para o limoeiro como que o desafiando... Ninguém subiria por ali também, nem invadiria a minha horta.
E iria para sala de estar, com aquele vidro que nunca fechava direito, e ninguém se incomodava, estava sempre aberto.
Acho que eu tinha medo daquela casa.
Acho que eu ainda moro lá, apesar de todos estes anos passados.
Mas eu queria voltar lá e entrar mais uma vez em seus cômodos, rever o quintal de minha infância e apaziguar todas as memórias e descansar... descansar... O que passou somente ao tempo pertence.
Eu fui feliz naquela casa, tive momentos de pura felicidade dos quais nunca me esquecerei.
Naquela casa todos estavam presentes, coisa que hoje não é mais possível. Lá, tivemos muitos Natais e Anos Novos e sempre havia um aniversário a se comemorar.
Havia alegria e muita ingenuidade. A vida se mostrava tão simples que nós ali acreditávamos nisso. Na simplicidade do mundo.
Só que o tempo foi passando. Novas pessoas chegaram e compartilharam suas vidas com as nossas. Um novo tempo, uma nova era... e foi aí que tudo começou a mudar.
Já não tínhamos mais esta casa. Vivíamos em um outro local, outro planeta. Só que ainda estávamos juntos e isso era o mais importante.
Dois anos se passaram e uma nova mudança se fez presente. E nesse novo local vivemos por quinze anos, até começarmos a nos separar.
Queria voltar para estes tempos e viver tudo de novo. Enfrentar todas as dificuldades que vivemos neste período, só que todos juntos.
Queria ouvir a sua risada que me dava tanto conforto e segurança, como se nada no mundo pudesse me ferir naquela hora, como se eu fosse impenetrável, como se eu mandasse no mundo.
E veríamos nossos filmes juntos, mesmo que você dormisse no meio - já estou tão acostumado a isso - e não quisesse se levantar do sofá. Dividir você com meus irmãos e não ter ciúmes. Ser apenas bom. Ser apenas eu. Ser apenas você.
Mas a vida acabou para você e nós ficamos aqui. Eu não tenho a sua força, nunca terei. Então fico perdido achando que não construí nada, não fiz nada e não sou nada.
E uma fé me move e leva-me adiante. E mesmo sem nada saber, acabo fazendo. Se é certo ou errado, não sei. Um dia vou saber. Enquanto isso me sobram apenas as memórias e tudo aquilo que eu sempre quis fazer e não fiz. E nem sei porque não fiz. Não sei... Estou sozinho e sempre disse que era assim que eu queria que fosse. Mas me dá um certo medo ficar envelhecendo sem ter ninguém ao lado, sem ter alguém a quem me dedicar. Alguém que precise de mim, como eu, agora, preciso de você.
Sabe aquele abraço forte de feliz Ano Novo? É disso que eu precisava agora. E também da sua voz consolando, do orgulho que eu sempre soube que você tinha de mim.
Tudo o que eu não preciso agora é da minha indiferença, de não mostrar o que eu realmente sentia.
É tão tarde agora.
E me resta tão pouco tempo.
Eu não sei dizer nada por dizer...
Eu me calo.
Onde está você agora?
Eu estou aqui... Chorando...
E com muitas saudades!
Texto publicado no livro Muito Mais, de Márcio Martelli, Editora In House (2007).