PASSAGEIROS NA VIDA*

O dia acordou brilhante,alegre e ensolarado,depois de um dia chuvoso.A cidade parecia uma casa depois de uma formidável faxina...Limpa!

Faz muito tempo que não notava o colorido das casas e dos jardins,e a altura das velhas árvores .O céu diferente de ontem,está mais alto,mais longe lindamente azul e branco.Até as pessoas,bem dispostas acordam cedo para o trabalho,todos sem pressa .

Não senti vontade de olhar o relógio,com medo de voltar a mesmice de antes,e o dia voltasse a ser como outro dia qualquer,mesmo porquê teria uma visita importante a fazer.

De frente para o mar,via os navios ao longe,pessoas que caminhavam e um grupo da terceira idade se exercitando no mar.

De repente lembrei que tinha marcado um encontro filantrópico,onde iríamos a um Lar de Idosos,levar roupas de cama,toalhas,remédios,produtos de higiene,além de levar o principal "a solidariedade",o "carinho" a tantos corações solitários.

Juntos precisamente às 04:00 horas seguimos,rumo ao asilo.Lá chegando,ocorreu a primeira surpresa.O "Lar" estava separado,de um lado ficava a ala feminina,e em frente tendo a rua no meio a ala masculina.

Decidimos visitar primeiro o setor feminino.Foi aí que me dei conta dos vários sentimentos que me dominaram.

Sentimentos de dor,de amor,de tristeza,de horror, de asco de pena.Um Lar repleto de mortos vivos,que vagueavam pelos corredores úmidos,escuros sombrios,com corpos decaídos,bocas murchas com dentes ou sem dentes,olhares vazios,cegos ao olhar o nada.Algumas poucas faziam crochê,outras coziam as próprias roupas íntimas,outras não levantavam sequer para fazer as necessidades,precisando que outros as ajudassem.

O cheiro asqueroso de vômito e de xixi,dava voltas no estômago.Não entendi por que ás mulheres eram mais dementes que os homens.Penso que é por causa da grande responsabilidade que tem em dar vida ensinar a viver ,e viver sendo cobrada por tudo.

Enquanto no Lar feminino,as TVs ficavam desligadas,não tinham interesse de nada fazer que não fosse dormir acostumada a solidão lembrando o tempo em que viveram.

Fantasmas,com artrites,artroses,reumatismo,asma incontinência urinária e outras doenças mais sérias,não tendo por quê ou quem esperar se faziam de mortas.

O "Lar" dos homens era mais animado.Encontramos vários homens sentados à mesa jogando cartas dominó e conversando.Caminhavam riam ,assistiam TV.Acho pelo que vi que o que impulsiona um melhor comportamento dos homens é que eles pensam e reinventam as experiências do passado. Sendo esse mentor às mulheres .

Mesmo assim tinha os que se prostravam,isolados remoendo as recordações e absolutamente isolados,demonstrando a prostração de corpos sem seus próprios comandos.

Sinistro,ficar cara a cara com às dicotomias e dualidades da vida.

A juventude e a velhice;a saúde e a doença;a beleza e a feiura;a

perfeição e a degradação...a vida e a morte.

Ali naquele depósito de velhos,esquecidos de suas famílias,víamos

perfeitamente a falta de dignidade,onde todos vivem em dependência

física e mental,que caminham na degradação.O surpreendente,é que mesmo nesse estado,alguns lutam contra a morte( embora nenhum tenham mais nada de seu ;nem seus corpos,suas mentes,suas casas,seus parentes seus filhos) na esperança de poder voltar ao convívio dos seus familiares.

De repente entendi;"Deus fez o homem a sua imagem e semelhança".

Somos tudo e seremos nada.Até as lembranças do que fomos,irá se perder pelos caminhos,e cada um virá para viver o mesmo caminho

recorrente.

Às 06;00,quase noite,voltamos,cada um com seus pensamentos,sentimentos do dever cumprido.Uns tristes ,como eu,sentindo verdadeiro pavor crente que na vida somos apenas transitórios passageiros.

Alzira Paiva Tavares

Olinda 17/07/09

arizla
Enviado por arizla em 19/07/2009
Reeditado em 10/10/2010
Código do texto: T1708207
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