O último encontro
Conheci um rapaz esse ano, era até boa pessoa, mas tão idiota que fazia pena ouvi-lo. Seu nome era Leonardo e o conheci por intermédio de uma cantada estúpida.
Simone, uma conhecida minha, ligou-me em pleno domingo convidando-me para sair. Tentei dizer-lhe que não podia, tinha que dormir cedo, mas ela é daquelas pessoas que só aprenderam a falar, e provavelmente não sabem o que é ouvir. Para completar, sou uma completa panaca para me impor, sempre acabo cedendo aos outros.
Fomos a um barzinho na feirinha e ficamos bebendo até que ela começou a demonstrar o real propósito de ter me convidado.
- E então Cíntia, como vai a sua vida amorosa?
- Estava bem quando a vi ano passado.
- Como você é engraçada! A minha iria muitíssimo bem se não fosse por um pequeno detalhe.
- Que coisa, não?
- Eu sei que você deve estar morrendo de curiosidade, então vou contar logo.
- Claro.
- Você conhece o Mateus, não é mesmo?
- Mateus que mora no Cabo Branco?
- Esse mesmo!
- Sim claro, ótima pessoa. Mas o que tem ele?
- Você se lembra do Paulo, amigo dele?
- Humm... não estou lembrada. Como ele é?
- Um moreninho, alto, vizinho da Naná.
- Ah sim, acho que lembro dele. Mas por quê?
- Bom, eu o conheci mês passado e ele me pareceu um rapaz muito interessante, falou muito sobre você.
- Tem certeza de que não era outra Cíntia?
- Absoluta. O rapaz parecia estar apaixonado.
- Por mim?
- Não, pela rainha Elizabeth.
- Tem gente que leva mesmo a sério isso de amor platônico.
- Não se faça de sonsa.
- Diga logo onde você quer chegar.
- Bom, como eu lhe disse, ele é um rapaz bem interessante e creio que você não esteja muito interessada nele, não é mesmo?
- Bom...
- Ótimo! Então será que você poderia deixá-lo pra mim?
- Deixá-lo pra você? Mas como, se eu nem o tenho?
- Desisto, é impossível falar com você!
- Oh, então você sabe como é isso.
- Adeus!
Simone levantou-se indignada, como uma princesinha mimada que está sendo contrariada pela primeira vez na vida. O pior de tudo é que a madame foi embora sem pagar um tostão pelo que bebeu. Acho que pelo menos assim eu aprendo a tomar atitudes na hora certa.
Como se não bastasse, ao perceber que eu ficaria sozinha pelo resto da noite ou me levantaria e iria embora após pagar a conta, um rapaz alto e gorducho dirigiu-se a mim.
- A mocinha está sozinha? - perguntou-me ele com um olhar de cafetão decadente.
- Não sei, por que não pergunta a ela?
- Senso de humor, gosto disso em uma mulher!
- Semancol, gosto disso em um homem!
- Hehehe, que preciosidade - disse ele já puxando a cadeira que estava ocupada pela minha "amiga" há poucos minutos, sentando-se sem cerimônia alguma. - E então, trepas?
- Meu senhor, por acaso estás treinando para o concurso de Pior Cantada do Mundo? Sinto muitíssimo, mas você definitivamente não faz o meu tipo.
- Ora, e por que não? Um rapaz alto, forte e loiro como eu? Aposto que sua amiga não me rejeitaria.
- Claro, desde que você comesse ouro no café-da-manhã. Mas por que não tenta? Ela não deve estar muito longe, pode ir atrás dela.
- O que é isso belezinha, e deixar você sozinha aqui?
- Eu juro que não vou chorar.
Foi nesse momento que o homem que anteriormente fazia questão de parecer esguio (o que no caso dele era meio complicado) envergou-se tão repentinamente que temi o pior.
- O senhor está bem?
- Por favor, não me chame assim. Sei que tenho a expressão cansada, mas não chego nem aos trinta e cinco anos.
- É que... você exala experiência...
- Não precisa me enganar, eu sei que sou horrível. Só esperava encontrar uma boa mulher que me apreciasse pelo que eu sou e não ligasse para a minha aparência.
- Talvez você só esteja usando a tática errada...
- Não é isso, eu já tentei me aproximar das mulheres das mais diversas formas, mas parece que elas sentem uma certa repugnância por mim, de forma que chego a me sentir como Quasímodo...
- Ora, você não é o primeiro a não compreender as mulheres, não desanime! Por que você não começa a tentar ser só amigo das mulheres? Talvez de uma amizade possa surgir um grande amor.
- Ser amigo de uma mulher?
- Ora, e por que não?
- Homens e mulheres não foram criados para ser amigos, mas para transar.
- Ah... Agora eu entendo a sua situação.
- É mesmo? Então você vai me ajudar?
- Talvez, podemos tentar.
- Vai transar comigo?
- Não, não é para tanto.
- Então..?
- Poderíamos conversar para ver se conseguimos superar essa sua barreira.
- Ah, conversar. Eu pensei que você fosse diferente, mas é igual a todas outras.
- Digo o mesmo de você.
- Humpf, já vi que estava perdendo o meu tempo. Adeus, mocinha!
- Au revoir!
E num movimento brusco, levantou-se da cadeira a ponto de quase virar a mesa, voltando-se para a rua e indo na direção desta sem virar o rosto para trás até sair do meu campo de visão. Em pouco menos de dois minutos pude ouvir o barulho do freio brusco de um carro e logo em seguida várias pessoas começaram a falar, cada uma mais alto que a outra, mas pude ouvir bem uma que se destacou entre todas as outras.
- Leonardo! - pude ouvir o desespero na voz dessa mulher. No momento tive muita pena dela, mesmo não sabendo quem era ela nem ele.
Tendo pago a conta, saí do bar e lá fora encontrei o Paulo, de quem a Simone tinha vindo me falar. O rapaz não saía de cima de mim e no fim das contas ele nem fazia o meu tipo, mas quando me lembrei da raiva que a Simone tinha me causado, acabei por me deixar levar pelos poucos encantos que ele tinha. Antes de ir embora ele me perguntou se eu tinha visto o gordinho que tinha sido atropelado essa noite. Perguntei as características deste a ele, que me confirmou as do que eu conhecera há pouco e lhe respondi que não havia visto. Ele me disse que o rapaz havia morrido na hora. Pobre Leonardo... Mas bem que ele merecia.
Ah, eu agora estou namorando o Paulo, ele até que não é de todo mal, mas o melhor de tudo é ver a cara de raiva da Simone toda vez que passamos por ela.