Abedula: - O casamento
* Da série ABEDULA
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No Oriente Médio , no tempo em que o pequeno Abedula usava turbante , a tradição das famílias de escolher os pretendentes era muito comum e a prática dos casamentos arranjados constituía uma tradição milenar , respeitada tanto entre famílias cristãs quanto naquelas que integravam a enorme maioria, quais sejam as islâmicas,que professam a fé muçulmana.
Quando Abedula chegou ao Brasil – homem feito – não obstante ainda jovem, já estava casado com sua prima em segundo grau , Dona Samira , uma mulher de temperamento calmo, magra e que apenas lembrava uma árabe pelos olhos que se escondiam fundos em disfarçadas “olheiras”. Generosa e boa companheira, vivia em harmonia com Abedula e não tardou em conquistar admiração e simpatia da vizinhança.
Com o passar dos anos foi se ampliando em Uruguaiana a presença de comerciantes Palestinos que chegavam em massa ao Brasil, sobretudo após a declaração de existência do Estado de Israel. Ingressavam com o passaporte da Jordânia, mas de jordanês só o documento, na real eram mesmo imigrantes Palestinos.
Naturalmente, após a ocupação da Palestina, o casamento arranjado que já era uma tradição secular, passou a ser imprimido como uma condição de manutenção da nacionalidade. Abedula contava que na constante história de guerras do Oriente Médio os povos sobreviviam por gerações graças ao controle das linhagens de sangue pelos patriarcas.
Dizia Abedula : - “Bode ver , Judeus ordodoxos não deixam filha casar com bessoas de outra raça” . E logo seguia sua lista de ponderações : - “Outras bovos também fazem assim, ciganos, bor exemblo...” . E de fato ele conseguia demonstrar em deliciosas conversas que existiam centenas de povos nômades que mantinham sua “nação” na base dos casamentos arranjados. Durante o êxodo dos judeus ao Egito, a raça se sustentou assim, com casamentos dentro da própria raça – argumentava.
Certa ocasião, um casal jovem , filhos de um comerciante muçulmano muito bem instalado na fronteira anunciou o casamento conjunto, o que tomou de surpresa a comunidade local. Festa marcada, espalhou-se um murmúrio generalizado e pelos quatro cantos da urbe não se falava em outro assunto. - Quando chegariam os noivos ?
Uma semana antes da festa chegaram à cidade , vindos da Jordânia, os pais dos pretendentes que a exemplo dos comerciantes daqui também iriam negociar o casamento do casal de filhos. Era, portanto, um casal para outro casal . Dizem que durante duas noites não se chegou a um consenso sobre o dote. Só no final da terceira madrugada de negociação os valores teriam sido fixados e confirmado o casório.
A festa foi um acontecimento marcante e conta a história que jamais havia se visto coisa igual em Uruguaiana. Uma dançarina veio de São Paulo e seduziu a velharada com a Dança do Ventre ao som de um conjunto que tocava velhas melodias árabes.
Mas o que mais marcou foram as acentuadas diferenças dos noivos : A menina brasileira por solo, mas oriental de sangue, era alta e casou-se com um árabe no mínimo meio metro mais baixo e, como que para desafiar as dunas do deserto, o rapaz de Uruguaiana que era alto, casou-se com uma baixinha retaca .
Uma imagem cômica, em mais uma página das mil e uma noites, desta vez escrita não nas areias do deserto , mas no papel vivo e verde dos solos férteis do sul do Brasil.