Abedula – O Prestobarba

* Da série "ABEDULA"

** Leia os demais contos do árabe

Já corria em Uruguaiana o comentário que no Bairro do Brás em São Paulo existia uma espécie de “Paraíso” para os lojistas e que numa tal rua chamada 25 de Março era possível comprar tudo o que um “bodegueiro” poderia imaginar, porém Abedula sempre preferia comprar dos “caixeiros viajantes” , porque inclusive ao longo de várias décadas, havia desenvolvido uma técnica de pechincha que empiricamente era muito eficiente.

Mas como sempre existe uma primeira vez para tudo, houve uma ocasião em que um empresário de Uruguaiana organizou uma excursão para São Paulo, destinada apenas aos lojistas da região e conseguiu logo vender muitas passagens para pessoas de Alegrete, Itaqui e São Borja, já que naquele então era muito difícil viajar do sul do Brasil para São Paulo. O Brasil mudava sua geografia – a ditadura militar sob o lema do “Pra Frente Brasil” rasgava novas estradas – o povo convivia com novos costumes e , no mundo, novas tecnologias e uma sociedade de consumo que se revelava . Nesse contexto só sobraram duas passagens para a venda ...

O organizador da excursão peregrinou diversas vezes até a Loja de Abedula e começou oferecendo prazos dilatados para pagamento. Não adiantou . Logo evoluiu para descontos que iam de cinco a dez por cento. Também não conseguiu entrar no bolso do “Patrício”. Quando o desconto estava na casa dos trinta por cento, o árabe começou a dar algum sinal – muito tímido – de interesse.

A odisséia prolongou-se até que Abedula fechou o negócio e comprou a passagem pela metade do preço pago por todos os demais passageiros ; evidentemente que o vendedor lhe condicionou o silêncio e ele ficou comprometido a manter segredo para evitar murmúrios e reclamações dos outros viajantes .

Comprou muita roupa barata e estava feliz com os negócios. O extase, contudo, foi quando entrou numa loja de departamentos e Abedula viu alguns estojos de creme de barbear que formavam um “kit” promocional e vinham com um barbeador descartável – uma novidade da década de sessenta – e ele logo fez os cálculos e foi comprando o estoque todo.

Chegando a Uruguaiana ele desfez os “kits” um por um , separando os barbeadores dos cremes e colocou à venda isoladamente cada um dos itens – diga-se de passagem a um bom preço – tendo faturado um dinheiro extra que jamais imaginara mesmo em seus mais cifrados sonhos.

Na segunda excursão para São Paulo, Abedula foi o primeiro a comprar passagem, mas para desespero de nosso árabe ao chegar na mesma loja de departamentos não encontrou mais a promoção e irado gritava dentro do ambiente : “Buta que bariu, eu vem aqui só brá combrá creme e barbeador brestobarba”...