SÉRIE: MULHERES DO BRASIL – A ENVOLVENTE

A situação era nova. Conhecera-a naquela manhã, quando a secretária anunciou o próximo cliente, e ela entrara sorridente no meu consultório. Era recém-formado em Psicologia e estava dando meus primeiros passos no atendimento clínico. Minha carteira de clientes ainda era pequena, mas a primeira dezena de atendimentos feitos mostrara-me que fizera a escolha certa: gostava de conhecer pessoas, estar com pessoas, ajudar pessoas. Naquele dia, algo novo, porém, estava por acontecer. Peguei o prontuário das mãos da atendente e li seu nome: Patrícia. Levantei-me. Fui até a porta recebê-la. A secretária saiu, trancando a porta atrás de si. De cara, percebi que atender aquela cliente seria diferente de tudo que fizera até então em minhas consultas. Era uma moça jovem, de seus vinte anos. Cumprimentei-a como de costume, mas o toque daquela mão sedosa em minha mão passou uma energia a que não estava acostumado. Havia um calor naquela mão suave que acionou algo dentro de mim. Indiquei-lhe o divã confortável e a cadeira de madeira maciça, um dos quais ela poderia usar para se acomodar. Rumei meio que desconcertado para meu posto de observação e sentei-me pressuroso. Patrícia era uma mulher envolvente e a determinação com que ela se apresentara a mim, parecia querer abalar as estruturas dos meus fundamentos acadêmicos. Deixei-a falar o que se passava. Descontrai. Ela ficou à vontade. Aliás, nem precisou tanto esforço. Falou por meia hora. Eu a observava. Não conseguia escutar suas palavras somente. Seu jeito envolvente de ser comunicava muito mais que as palavras propriamente ditas. Patrícia tinha fala mansa, jeito suave. Falava baixo, quase que convidando você a se aproximar dela para ouvi-la. Mais que isto, para tocá-la ou ser tocado. O toque dos seus lábios em meus lóbulos. O toque de sua fala em meu coração. Falava pausado. Palavras medidas, gestos estudados, programados, articulados. Sua gesticulação era grandiosa, quase que te agarrando, te segurando, querendo puxar você pra junto dela. Sem me dar conta, passados alguns minutos, percebi que não mais estava na cadeira que me assentara originalmente. Estava mais próximo. A meio caminho de onde ela estava, numa poltrona individual com braços largos e recosto amplo. A luz cálida do ambiente e o som mavioso do instrumental de violinos e cordas deixavam o ambiente ainda mais aconchegante. Olhava aquela mulher narrando suas angústias à minha frente e meu pensamento divagava não só sobre o que ouvia, mas, especialmente, pelo que via. E o que via naquele momento, à minha frente, eram os olhos de Patrícia. Olhos azuis, grandes, preenchedores do globo ocular, de uma forma magistral, de jeito que se tornavam gulosos, sedentos, famintos de ver. Olhar. Olhar. Olhar. Olhos penetrantes, misteriosos. Magnífico olhar! E eu, ali, quase a naufragar naquele mar. Patrícia era uma mulher envolvente. Estava quase que magnetizado naqueles majestosos olhos azuis, quando o celular dela tocou. Fui salvo por este equívoco da preparação da entrevista. Teria até a semana que vem para tentar planejar alguma coisa que me desse à chance de escapar ileso de mulher tão envolvente. O que eu não sabia, até então, era se queria...

ALEX GUIMA
Enviado por ALEX GUIMA em 01/05/2006
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