Eram quatro amigos...
Era uma vez quatro amigos que cresceram juntos, numa pequena comunidade e que tomaram caminhos opostos quando tornaram-se adultos.
Maleco, Maneco, Marreco e Matreco. Eram extremamente diferentes; em comportamento, atitudes, propósitos e desejos.
Maleco buscou nos estudos seu desejo de conquista, fez Direito, conheceu pessoas influentes e casou-se com uma garota rica.
Maneco procurou no trabalho rústico seu destino. Casou-se muito cedo, teve quatro filhos e mudou-se para a capital, bem dizer, na periferia da cidade grande.
Marreco foi além da anormalidade, não estudou e tampouco trabalhou. Enveredou para o mundo da criminalidade, ganhou os morros e tornou-se o maior fora-da-lei do seu estado.
Matreco serviu o exército, pegou gosto por fardas, ingressou na carreira de militar, entrou para a policia e é o que se sabe até então.
Aqueles amigos viviam em seus mundos distintos, cada qual em seu mundo particular. Eram pessoas que, por algum fator social, fizeram-lhes dispersar das suas origens, suas famílias, seus costumes e seus laços de amizades.
Maleco, logo conquistou a confiança da família da sua esposa e assumiu a assessoria jurídica das empresas e de todo patrimônio da sua amada. Passou a viver na alta sociedade, sempre arrogante e prepotente, jamais mencionada de onde viera. Sua vida era dividida entre os negócios e as viagens, seus carros luxuosos e as amantes, o golfe e o Tricolor.
Maneco sempre foi um excelente trabalhador. Trabalhava dia e noite, em construção civil. Era um mestre de obra responsável e fiel aos princípios morais: O trabalho, a igreja e a família. Levava uma vida difícil, mas vivia feliz, tinha orgulho do seu trabalho, de seus filhos e da sua casinha comprada à prestação, pela CDHU. Tinha uma bicicleta que o levava ao serviço diariamente, adepto à marmita e a inseparável camisa do Peixe.
Marreco era audacioso, astuto e perigoso. Foi preso algumas vezes, cuja estadia, especializou-se no crime. Naquela que foi sua grande fuga, ganhou o Morro do Maroto e todo quadrante, tornando-se o maior e mais temido traficante de drogas. Tinha seu exercito particular, vivia numa fortaleza, gostava e ouro, armas, uísque e do Timão, Convivia com quatro esposas ao seu lado, sem confusão, senão as matava e casava com outras, já prometidas ao grande rei.
Matreco, muito forte e ligeiro, foi incorporado á tropa de elite. Treinou nos EUA, em Israel, muito cauteloso, pouco se expunha. Morava num bairro de classe média da capital, divorciado, uma filha, seu passatempo era; caçar, clube do tiro, academia e os domingos ver o Verdão.
Muitos anos passaram até que o destino resolveu uni-los de novo. Foi numa quarta-feira, ao final da tarde. Maleco saia do estacionamento do banco com o seu BMW, quando foi surpreendido por quatro marginais fortemente armados. Renderam-lhe, tomaram-lhe de refém e levaram o cárcere numa casa da periferia da cidade. Exigiram resgate à família. A polícia e a imprensa acompanhavam o caso.
Descobriram que o mentor e negociador é o Marreco do Maroto. Descobriram também o local do cativeiro. Houve um cerco policial no local indicado. Um bandido, na fuga, acabou invadindo uma residência próxima. Levou o seqüestrado consigo e uma família também refém daquela situação. Os demais delinqüentes foram presos. Aquelas pessoas envolvidas serviriam como moeda de troca nas negociações entre aquele marginal e a policia. As crianças aos poucos foram sendo libertadas, a mãe, em pânico, foi liberta logo em seguida.
Restaram poucos indivíduos naquele recinto, cercado de viaturas e monitorizados pelas câmeras da imprensa: O encapuzado seqüestrador, muito agressivo; o seqüestrado, ferido facialmente; o proprietário do imóvel invadido, um barbudo amedrontado.
Até então não havia diálogo, só gritos de ameaças de morte. Até que houve uma pausa, um silêncio, o capuz tirado, o sangue estancado da face, o boné arrancado e, surpreendentemente, os olhares que cruzaram naquele instante. Foi como um farol ao mar piscando e indicando ao navio a direção do porto, assim foi o reconhecimento daqueles ex-amigos de infância. Por um momento não houve conversa alguma, até que o Maleco inconformado pergunta por que, justo com ele. Marreco diz que não sabia quem era, se soubesse teria escolhido outro grã-fino. Maneco lamenta aquela situação e, justamente em sua casa. Falaram rapidamente de suas vidas, suas escolhas, erros e acertos.
As horas noturnas passavam lentamente. Marreco, mesmo contra sua vontade sabia que teria de mantê-los como refém. Deixou-lhes mais calmos, longe das ameaças e só pedia-lhes paciência para poder fugir e assim tudo acabaria numa boa.
Às quatro da madrugada, um tiro, um estampido, um clarão, um grito foi escutado pela janela. Alguém dentro da casa foi baleado. Houve alvoroço, corre-corre, sirenes acesas... Uma operação desastrosa da policia pôs tudo a perder. Um atirador de elite, de capuz verde, acertou de raspão o Marreco, mas em cheio o peito do Maneco. Morte instantânea. Marreco descontrolado começou a revidar. Ao carregar o pente de sua pistola, um tiro foi disparado acidentalmente acertando de impacto o pescoço do Maleco. Este caído agonizava no chão. Marreco percebeu que seu plano de seqüestro deu errado, seus comparsas foram presos e possivelmente executados, sua fuga tornou-se impossível e o pior, seus amigos de infância que acabara de reencontrá-los estavam mortos aos seus pés. Sem poder mais nada fazer, apontou sua arma contra sua cabeça e suicidou-se. O policial que atirou erroneamente, ao saber do acontecimento dos fatos, não agüentou a pressão e se enforcou no quartel militar; Era o matreco.
Quatro amigos mortos, unidos pela tragédia, quatro histórias de vida, resumida em uma noite de horror.
Quando crianças, alguém comentou, eram inseparáveis; nas brincadeiras, nas brigas, nas paixões e na fidelidade. Apenas contrariedade no futebol. Diziam eles que morreriam juntos se caso fosse preciso.