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SABEDORIA DE MULHER QUE NÃO DESISTE!


-Carla, não aguento mais ficar de arranca-rabo com o Tony! – Desabafou o pai.

- Calma, Elias! É a idade... – Justificou a mãe.

-Idade!? Quando Tony tinha oito anos e aprontava você dizia que era a
idade... Quando ele ficou adolescente e começou a ficar respondão, você dizia que era a idade... Agora com dezoito anos, um homem feito, você continua a me dizer “é a idade”! Que droga de vida é esta? – Bradou o pai alterado.

- Elias... Como mãe e enquanto mulher preciso ser ponte para uní-los, dois cabeças duras. – A mãe compassiva tentava abrandar a agitação do marido.

- Fica botando pano quente nas atitudes desse rapaz que ele vira uma cobra! É capaz ainda de lhe picar. – Zangou-se Elias.

-Deus me livre, Elias! Não diga umas sandices dessas! Morde na língua! Sabe muito bem que a palavra tem poder. De tanto ficar pensando coisas ruins é que se realizam. Ainda bem que enquanto você o amaldiçoa eu vou o abençoando! – Carla repreendeu o marido.

- Eu falo de preocupação, querida... Você sabe que amo nosso filho. Ele foi uma criança desejada, só não entendo nem aceito a rebeldia gratuita dele. - Reconsiderou o pai.

- Se nós que somos pais não tivermos paciência com ele, aí é que corremos o risco de afastá-lo para sempre da nossa presença. – A mãe disse pensativa.

- Esta casa quando chego do trabalho parece uma torre de babel... O som alto até quase estourar meus tímpanos. E o modo como o Tony se comunica conosco. Apesar de estudar numa ótima faculdade, usa uma linguagem para mim incompreensível, se é que se pode chamar aquilo de linguagem!  – Protestou o empresário.

-Ah, chega Elias! Até parece que vocênão usava gírias. Como você me chamava mesmo, hein? Ah... Era de “teteia”. Olha que coisa mais feia ser chamada assim! - Brincou Carla.

- Feia... Você adorava quando a chamava assim... – Elias até relaxou a expressão sisuda com as lembranças da mulher.

Carla sabia que precisava dar um jeito naquela situação. Quantos casais se separam por causa dos temperamentos dos filhos. Lembrou-se da amiga dizendo: "Antes da nossa filha ter crescido, nunca havia brigado com meu marido. A situação saiu do controle e você sabe como alguns homens agem. Se não está bom, eles nem se importam com os filhos, largam a família na hora em que mais se precisa de ajuda..."

Carla olhou para Elias e disse:

- Tá bom... Agora vai trabalhar que já está na hora...

Já ia entrando no carro quando Carla o chamou:

- Querido...

Elias olhou e esperou que ela dissesse:

-
Hoje vou conversar com o Tony. Peço que não desista dele nem perca a paciência. Pense que é fase de transição de conflitos. Daqui a pouco
ele vai ter que caminhar com as próprias pernas. Trabalhar, entrar no
mundo adulto, ter responsabilidades e isso assusta... Você sabe disso.
Há muitos pais que abandonam os filhos aos primeiros sinais de
rebeldia. Eu não farei isso, jamais. Ele é meu filho e o amo demais.
Vou lutar por ele. Vou resgatá-lo. Trazer de volta aquele menino
maravilhoso que ele sempre foi...

Elias era metido a durão. Entretanto, ao ouvir aquelas palavras vindas de um coração de mulher, de uma mãe, ficou com os olhos vermelhos. Nada disse. Aproximou-se da mulher, deu-lhe um beijo carinhoso e falou:

- Desculpe pelas durezas que disse, estava nervoso...

-Tudo bem, entendo você. - Elias seguiu para o trabalho.

Depois que Tony chegou da faculdade de Medicina, a mãe já havia planejado sair com ele, pois queria pôr em prática uma ideia que lhe ocorreu:

- Tony, meu filho, vamos ao circo? – Perguntou de uma só vez para dar impacto e o filho não pensar em um desculpa para não ir.

- Circo? Qual é, Mãe... Tá pensando que ainda tenho cinco anos? Viajou! – Zombou o filho.

A mãe viva, esperta, cheia de artimanhas, fez uma encenação. Pôs no rosto uma tristeza sem fim, dessas de fazer cortar o coração, olhando para o filho foi falando pausadamente como se tivesse aquele nó na garganta de vontade de chorar até o amahecer:

- Está bem... Eu vou sozinha mesmo. Aliás, estou sempre só... Já estou me acostumando com esta realidade. Virou as costas e foi andando cabisbaixa.

O filho era rebelde, respondão... Mas, no fundo era um ótimo rapaz e a mãe sabia disso. Mãe sabe até onde vai a agressividade de um filho, por isso fez aquela manha de  carente.

Arrependido e incomodado por ter magoado a mãe, Tony diz antes dela sair do seu quarto:

- Mãe... Espera! Vou só trocar a camisa, guenta aí...

- Não precisa, eu entendo que não queira sair comigo e... – Foi interrompida por ele.

- Nada a ver... É que circo não curto muito. Mas, quer saber? Vai até ser “manêro” ver umas palhaçadas. Só que vou avisando... Vou zuar legal lá! – Avisou Tony.

- Eu é que vou! Paga pra ver, só! – Divertiu-se a mãe.

Palhaços, mágicos, corda-bamba, trapezistas... Ainda não era aquilo que Carla queria que o filho visse. “Será que não vai ter?” A mãe estava um tanto ansiosa. Tony com pipocas e churros nas mãos lembrava mais aquele gurizinho de oito anos de idade que morria de medo dos palhaços.

Foi então que vieram eles. Leão e seu simpático domador. Carla sorriu
satisfeita com aquela visão, pois era justo que precisa no momento para pôr seu plano em prática.

-Olha, Tony! Quero que preste bem atenção na fera e no domador.

-Por que, qual é a parada? – Tony ficou curioso.

- Apenas olhe... – Disse a mãe.

Ao fim da apresentação, Tony diz para a mãe:

- Foi “manêro”! Deu maior agonia ver aquele maluco enfiando a cabeça dentro da boca cheia de dentes do leão. – Comentou Tony.

- É que o domador, meu filho, domou o leão... Só que o domador só
conseguiu isso por que antes o leão “domou” a fúria dele. – A mãe ia
falando de maneira detalhada para que o filho entendesse o ensinamento que ela tentava lhe passar.

- Puxa, mãe... Bacana o que você disse aí. – Tony olhou para mãe como se descobrisse nela uma mulher cheia de virtudes.

A mãe aproveitou aquele momento de serenidade do espírito do filho e comentou:

- Tony... Hoje seu pai foi trabalhar muito aborrecido.

-O que foi? Reclamou de mim, já sei... – Nas outras vezes Tony já
retrucava aos berros, saindo de perto da mãe, indo para a rua ou para a casa de algum colega ou da namoradinha. Ali ele só ficou de cara
fechada.

- E com razão que seu pai tem reclamado dos seus modos.
Você já não tem cinco anos como você bem disse. Você precisa fazer como o leão e domar a sua fúria.

Carla continuou:

- Quando você era pequeno, muitas vezes, seu pai e eu fizemos as vezes do domador. Por várias vezes eu domei sua fúria com conversas, com músicas, com orações... Agora é chegada a hora de você dominar seus ímpetos de agressividade. Precisa respeitar mais seus pais. Nós o amamos, estamos do seu lado, não somos inimigos para sermos tantas vezes atacados. E para piorar, nada fizemos para merecer essa fúria. Toma cuidado, filho, para essa agressividade não se tornar uma ingratidão com seus pais. – Carla era uma mulher sensível, porém, firme no agir. Por mais vontade que estivesse de chorar, mantinha a firmeza para não demonstrar fraqueza. Pois ali naquele momento não era hora de fraquejar. O momento exigia pulso firme. Era tudo ou nada. Carla estava apostando alto naquela relação amorosa.

Tony parecia envergonhado. Aproximou-se da mãe e a abraçou fortemente dizendo:

- Mãe, vou tentar melhorar a partir de hoje, entendi seu recado...

- Ainda bem que você disse “vou tentar” e não vou mudar! – A mãe ria nessa hora.

- Por que ainda bem, então? Mudar não é melhor que tentar, não? – Estranhou o filho.

- Não, meu filho! Mudança leva tempo. Ninguém muda da noite para o dia a não ser que aconteça uma tragédia, uma coisa que abale muito a ponto de mover uma mudança radical. Quando disse que ia tentar, vi que você vai mesmo conseguir, pois seu pai e eu vamos fazer de tudo para que essa mudança seja uma realidade.

- Obrigado, mãe, pela confiança, pela força e principalmente, por esta lição do leão. Não vou esquecer nunca mais. Irei guardá-la para ensinar a meus filhos, netos bisnetos... – Tony parecia mesmo disposto a tentar “domar” seu espírito agressivo.

- Sabia que você tinha puxado a mim! Seus defeitos são do seu pai... – Brincou a mãe.

- Ihhh... O pai fala a mesma coisa, ele diz que eu só puxei dele, as coisas boas e que eu herdei os seus karmas. – Tony falou achando graça dos pais.

- Ai que danado! Seu pai falou isso? Deixa ele comigo! Os defeitos são deles! Mas, filho feio... Quem os quer? – Carla estava satisfeita com aquela conversa.  Sentia-se feliz por ser uma mulher forte e cheia de boas ideias na cabeça.