Irreal
Não reparei o choro de Eulália. É, eu até que vi que ela passava as mãos pelo rosto, mas não reparei as lágrimas. Há muito adiava a decisão de consumar o ato, apesar das constantes discussões e desentendimentos. Por um momento lembrei da primeira vez que a vi. Estávamos num evento de um amigo em comum. Eulália foi um rosto entre tantos, mas foi o rosto. Alguém nos apresentou e então tudo começou.
Foram sete anos. Caramba! Sete anos. Como o tempo passa... Olhei com ternura para aquela figura sentada na cama, cabelos despenteados, olhando fixamente para algo, apertando uma peça de roupa entre as mãos. Um sentimento esquisito invadiu meu peito. Desviei o olhar. Algumas questões passaram a fervilhar minha mente: “Por que?” “Será que estou me precipitando?”. Não. Não há mais como continuar. E o fim.
Voltei meu olhar para Eulália e encontrei seu olhar firme e decidido. O mesmo olhar com que me recebia nas madrugadas. O mesmo olhar que substituiu as palavras quando me “pegou” com a loura Valdete (há... Valdete) do 7º andar. Fixei meu olhar e falei: “Acabou”. Surpreendentemente, Eulália levantou, passou as mãos nos cabelos, chegou bem perto e, com muita calma, respondeu: “Que pena. Você é legal Jorge, mas já estava insustentável. Vai. Me deixe aqui. Vou sobreviver”. Passei as mãos no rosto dela e a beijei a face. Quando me virei para sair, ela continuou: “Me perdoe”. Voltei surpreso, afinal o canalha sou eu. “Não poderia continuar dividida entre você e seu irmão”. Falou e voltou para o quarto. Senti meu rosto gelar. “O que?” A pergunta ficou represada. Era como se um torno estivesse apertando o meu coração. Fui até o quarto. Eulália estava de pé olhando pela janela. A segurei com força. Voltei seu corpo contra o meu e a beijei profundamente.