Porque é sexta

Parei com o carro e tentei observar melhor o movimento das pessoas. Olhei o relógio: Nove e meia da noite. Era uma sexta-feira e as mesas dos bares na Cinelandia proporcionavam um espetáculo humano de diversas expressões e atitudes. Eu, me senti mais um.

Desci do carro. Entrei num destes e me sentei. Um garçom de meia idade, bigode, vestido a rigor, fez cara de "Bom amigo" e me estendeu o menu. Retribui com um aceno. "Uma caipiríssima, se possível com rum" pedi. "Carta ouro ou prata?" perguntou o Mais novo "amigo". "Prata" respondi, agora com um breve sorriso.

Observei ao redor e a minha frente um casal trocava carícias; Ao lado um grupo de pessoas conversava animadamente; Numa outra mesa mais a frente dois homens conversavam enquanto uma mulher observava uma outra coisa não sei aonde. "Seu drink senhor". Instintivamente, rodei o canudo no líquido e provei. Aprovei. Continuei, então, meu exercício mental que se resumia a um diálogo comigo mesmo. Porém meus olhos insistiram em vaguear e parar na mulher. Reparei que era do tipo cheinha, cabelos curtos pretos, pele branca e uma expressão bem séria. Desviei o olhar. Brinquei com o copo e busquei informações comigo mesmo. Quem será? Seu nome? Por que está assim, aparentemente tão distante ainda que tendo a companhia de dois homens? Voltei o olhar. Senti meu corpo estremecer. Ela me olhava diretamente. Insisti. Ela também. Desisti. Olhei para o meu copo e o conduzi para mais um gole. Porém algo mexeu comigo. Que estranho!? Há tempos que havia optado pela solidão. Agora... Bem, deixa pra lá. Chamei o “amigo” garçom e pedi “mais uma”. Levantei. Me dirigi até o corredor que dava acesso ao banheiro. Não sei por que estava me sentindo estranho. Lavei o rosto e voltei. Quando sai do banheiro, dei de cara com... Ela. Não deu pra disfarçar. Ela se aproximou e me olhou profundamente. Retribui o olhar. O silêncio. Os dois ali, parados. Levei a mão até seu rosto e toquei. Ela não reagiu. Abaixei a cabeça e decidi voltar a minha realidade. Virei a caipiríssima de vez, pedi a conta, paguei e saí.

Um momento que me trouxe de volta a vida como vida.

Um momento em que meu coração me lembrou que pode acontecer de novo. Entrei no carro e sorri.